# 6

abril de 2014

Ver com olhos livres, Alair Gomes & Frederico Coelho

A aventura de uma fotógrafa, Dayanita Singh

Estúdio Malick, Malick Sidibé & Dorrit Harazim

Cachorros emprestados, Richard Avedon

Em casaRaul Garcez & Antonio Risério

O parque, Rineke Dijkstra & Cees Nooteboom

Futuro do pretérito [composto], Rubens Mano & Sérgio Bruno Martins

A eternidade na esquina, David Perlov & Ilana Feldman

Fotojornalismo em crise?, Fred Ritchin, Francisco Quinteiro Pires & Mídia Ninja

A política da imagem, Antonio Manuel & Luiz Camillo Osorio

Pietà, o drama moral de W. Eugene Smith, W. Eugene Smith & John Berger

[extra] A não história de um chofer & Reflexões críticas e sinceras sobre a fotografia [1976], Alair Gomes

TEÓRICOS E ARTISTAS debatem o que garante à fotografia uma linguagem própria desde a invenção da técnica. Em 1976, decidido a meter a colher no pote, Alair Gomes, fotógrafo prolífico e escritor compulsivo, desfiou seus argumentos em “Reflexões críticas e sinceras sobre a fotografia”. Depois de quase 40 anos, o rigor e a originalidade do seu pensamento continuam se fazendo ouvir. O trunfo da fotografia, diz Alair, é a possibilidade de lidar com uma grande quantidade de imagens – e, portanto, com sequências narrativas. E é esse raciocínio que ilumina sua obra, como se vê nas fotografias e no texto garimpados em seu arquivo e até hoje inéditos, segundo a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.

A unidade narrativa e a reflexão sobre a linguagem sempre foram questões da ZUM. A convite da revista, a indiana Dayanita Singh refaz sua trajetória num ensaio que costura texto e imagem, verdade e ficção. Em novo trabalho, Rubens Mano apresenta uma coleção de 60 fotografias extraídas de seus vídeos de Brasília – sua visão direta da cidade equilibra concreto e improviso, ruína e construção. Afetuoso e não menos melancólico, o olhar de Raul Garcez esquadrinha as dependências do primeiro conjunto habitacional de São Paulo, erguido nos anos 1950.

Em tempos de selfies irrelevantes, retratos estrepitosos desfilam nesta edição. Numa palestra bem-humorada e confessional, Richard Avedon desafia a naturalidade da pose ao declarar a impostura de seus álbuns de família e sua admiração pelos desenhos de Egon Schiele. A holandesa Rineke Dijkstra talvez tenha ouvido os conselhos de Avedon: com um dedo na pintura, ela expõe o desconforto de jovens e crianças convidados a posar às vezes por longos períodos em parques de vegetação exuberante. Perto de completar 80 anos, Malick Sidibé eterniza o entusiasmo das modas e modos da sociedade malinesa no período pós-independência.

A fotografia revela aos poucos seus grãos políticos. Enquanto David Perlov reflete sobre a montagem cinematográfica ao misturar o público e o privado, Antonio Manuel intervém na imprensa e na imagem para amplificar sua voz artística. Pensador incontornável quando se trata de fotojornalismo, Fred Ritchin discorre sobre o futuro da profissão e a inadequação do termo “fotografia digital” para descrever o que vem por aí. Ritchin é ilustrado por um ensaio do coletivo Mídia Ninja sobre temas que tocaram o país e o mundo. Haverá um pixel no fim do túnel? Ou será que, como provocava Alair, a fotografia ainda não adquiriu plena consciência de si?

# 5

outubro de 2013

Memórias de Nova York, Mario Cravo Neto & Jonas Lopes

O álbum de Pablo Escobar, James Mollison & Paulo Werneck

A última viagem, Chris Marker & Eduardo Escorel

Entre o céu e o inferno, Alberto García-Alix & Cassiano Elek Machado

A aventura do olhar, Sergio Larraín

Uma vida em cores, Raymond Depardon & Hélène Kelmachter

Os dois corpos do rei, Lütfi Özkök & Pierre Michon

A prata da China, Beijing Silvermine & Joan Fontcuberta

Criaturas, Sofia Borges & Felipe Scovino

A nova cartilha da guerra, Adam Broomberg e Oliver Chanarin & Julian Stallabrass

[encarte] Passe livre, Cia de Foto & Eugênio Bucci

EM JUNHO DESTE ANO, o Movimento Passe Livre convocou passeatas em São Paulo para protestar contra o aumento na tarifa do transporte público. A violenta repressão da polícia e a insatisfação geral da população levaram milhões de pessoas às ruas em centenas de cidades do país. Os protestos seguem até hoje.

Como uma revista semestral, dedicada à fotografia, pode contribuir com o debate político? Uma das respostas está no ensaio inédito do coletivo Cia de Foto, publicado em forma de cartaz. Sem insistir no quebra-quebra e na truculência que inundaram a mídia, as imagens iluminam a participação do indivíduo e do grupo na defesa dos ideais democráticos. Reflexão ainda mais pertinente porque feita pelos fotógrafos que, no começo dos anos 2000, esquentaram o debate sobre a autoria ao assinar as imagens com o nome do coletivo, e não de quem bateu a foto.

Política e democracia permeiam esta edição. Chris Marker, que morreu em 2012, experimenta com imagens de baixa resolução feitas no metrô de Paris. Sua obsessão pelo rosto feminino é também um retrato involuntário do batalhão de imigrantes que engrossa as artérias da cidade. Não menos engajado, Raymond Depardon acerta as contas com a fotografia colorida ao rever a carreira de viagens e conflitos, num depoimento em que a história pisca os olhos a cada esquina. Recontada em imagens de arquivo, a trajetória de Pablo Escobar é um período de violência e opressão que precisa ser encarado para que não seja esquecido.

Fotografias chinesas descartadas expõem o entusiasmo e a inocência que acompanharam a abertura promovida pelo governo de Deng Xiaoping. Mas será que as fotos gozam de status artístico? É o que discute o pensador catalão Joan Fontcuberta.

Experimentação e rebeldia não raro dão origem a boa arte. Na virada dos anos 1970, Mario Cravo Neto levava a cor, o volume e as distorções de suas esculturas para diferentes suportes artísticos. Exibidas pela primeira vez neste ano, as fotografias são o pontapé da produção colorida que o deixaria conhecido. A alguns anos e milhas dali, Alberto García-Alix viveria em preto e branco a colorida movida madrileña que tomou a Espanha pós-Franco.

Para animar a febre de livros, uma resenha de fôlego discute War Primer 2, ambiciosa intervenção gráfica e política da dupla Broomberg & Chanarin sobre a cartilha de guerra de Bertolt Brecht publicada em 1955.

Resta, por fim, o conselho dado pelo chileno Sergio Larraín ao sobrinho. Quando vir algo bom num livro ou numa revista, deixe-os abertos na página, em exposição, durante semanas, meses, ou enquanto aquilo te disser algo:
“A gente demora muito para enxergar”.

 

# 4

abril de 2013

Bulevar, Katy Grannan & Seth Curcio

Imageatlas.org, Taryn Simon, Aaron Swartz & Marina Bedran

O guardião da história, Li Zhensheng & Dorrit Harazim

Uma vez, Wim Wenders

Alta voltagem, Garry Winogrand & Arthur Lubow

Cinquenta e cinco, Rosângela Rennó

A vida oculta das cidades, Thomas Struth & Richard Sennett

Estrela brilhante, Bárbara Wagner & Thyago Nogueira

São Paulo, em corte, André Cepeda & Agnaldo Farias

Bye, bye, Japão, Shomei Tomatsu & Leo Rubinfien

Argélia na mira, Pierre Bourdieu & Franz Schultheis

Retícula, resenhas

O INDIVÍDUO, a multidão. Gênero tradicional da história da fotografia, o retrato pode descrever em detalhes um sujeito específico e, ao mesmo tempo, sugerir a existência de um tipo social. Bons retratos fazem isso, e ainda tocam em questões que dizem respeito a todos nós. As figuras marginalizadas escolhidas por Katy Grannan nas ruas da Califórnia habitam a fronteira que separa realidade e fantasia, e nos obrigam a pensar nos padrões de beleza e de gênero, nos ditames da moda e no mundo retocado pelo Photoshop. Quatro décadas antes, Garry Winogrand também trilhava as ruas para compor um retrato em preto e branco dos tempos inflamados e incertos que rondavam o pós-guerra americano.

Tempos turbulentos também agitavam o outro lado do planeta. Repórter fotográfico do Diário de Heilongjiang durante a Revolução Cultural, o chinês Li Zhensheng escondeu no assoalho de casa milhares de negativos que exibiam o fervor da multidão e a arbitrariedade do regime. Ao duvidar do entusiasmo inicial e tomar consciência do que acontecia, Li mudou, senão a história, pelo menos a memória do século 20.

A fotografia pode ser usada como forma de lidar com uma realidade opressora, de se aproximar do mundo ou apenas de enxergar melhor. É o que afirma o renomado sociólogo Pierre Bourdieu sobre sua temporada argelina. Em rara entrevista dada no fim da vida, Bourdieu comenta como suas 3 mil fotografias ajudaram a definir o olhar que está no cerne de sua sociologia.

Outros peregrinos talentosos desfilam nesta edição. O cineasta alemão Wim Wenders vai da Austrália ao Meio Oeste americano num diário que reúne anotações, amigos e fotografias. A pedido da ZUM, a mineira Rosângela Rennó resgata dos slides de família a viagem que seus pais fizeram em 1958 pelos Estados Unidos. Bárbara Wagner se aventura em Pernambuco para mostrar um maracatu diferente do que estampam os cadernos de turismo. E o português André Cepeda estreia o resultado de uma residência que fez em São Paulo, acompanhado de sua câmera 4×5.

Viagens também ampliaram a dimensão social e política do trabalho de Thomas Struth. Para analisar a obra do fotógrafo alemão, o sociólogo Richard Sennet arma um debate coletivo que discute como o passado, o presente e o futuro estão inscritos na aparência das cidades. Voltando a um dos temas desta edição, Struth acredita que suas fotos urbanas podem ser vistas como retratos. Entendidas como organismos vivos, as construções sempre diriam a verdade. “São o testemunho do caráter das pessoas, expressam orgulho, raiva, ignorância, amor – tudo o que os seres humanos são capazes de expressar”.

[:pb]

 

# 3

outubro de 2012

Transposição, Caio Reisewitz & Natalia Brizuela

A dança da solidão, Francesca Woodman & Arthur Lubow

Tudo de novo sob o sol, Luigi Ghirri & Marina Spunta

Infância banida, Plínio Fraga & arquivo do SNI

Perseguindo sombras, Santu Mofokeng, Tamar Garb & Jyoti Mistry

Sobras, vidros e a eternidade, Geraldo de Barros & Antonio Gonçalves Filho

A fé na encruzilhada, Guy Veloso & José de Souza Martins

O Grupo Atlas (1989-2004), Walid Raad & Sergio Mah

O cidadão Meeropol, Dorrit Harazim

Forma e pressão, Stephen Shore

O melhor amigo do, Eduardo Climachauska & Rodrigo Naves

A fotografia como linguagem universal (1931), August Sander

A-foto-da-favela-de-Paraisópolis, Tuca Vieira

Retícula

[:en]
[:]

RAROS FOTÓGRAFOS são capazes de construir uma obra visual sólida e ao mesmo tempo enunciar os motivos que os levaram a tal construção. Do embate com a paisagem americana dos anos 70, o fotógrafo e professor Stephen Shore tira uma conclusão saborosa: a forma não é calda artística que se derrama sobre o conteúdo; para que ela tenha sentido, é preciso extraí-la da própria experiência.

No cardápio desta edição, vários fotógrafos se dedicam à paisagem como forma de compreender o mundo. Seja ela construída com tesoura e fita adesiva sobre lâminas de vidro, como as Sobras pouco conhecidas realizadas por Geraldo de Barros nos três últimos anos de vida. Seja feita de um clique elaborado, como os tirados pelo italiano Luigi Ghirri. Pouco estudado no Brasil, Ghirri desdobrou seu gênio em fotos e escritos, e uniu o talento de um olhar iluminado ao faro para os assuntos mais prosaicos. Na volta de uma viagem pelo rio São Francisco, Caio Reisewitz traz na mala suas cenas do sertão monumentais.

Criado no fotojornalismo de Joanesburgo, Santu Mofokeng discute a representação dos negros e põe em xeque a ideia de documentário social. A propriedade da terra, a marginalização econômica e a espiritualidade são alguns dos grãos políticos que informam seu trabalho mais recente. Enviado a Brasília para escabichar o Arquivo Nacional, o repórter Plinio Fraga faz um garimpo surpreendente: das 15 mil fotos recém-liberadas para consulta, pelo menos três provam que crianças foram enviadas ao exílio e fichadas pela ditadura. Dorrit Harazim narra a vida de um professor americano que mudou a história ao cruzar com duas fotografias: de um linchamento em Indiana, Abel Meeropol ergueu uma canção; dos órfãos de um casal de espiões, o poeta-compositor construiu sua família.

Há dez anos, o paraense Guy Veloso corre o país atrás dos penitentes. As tiras de filme que aparecem nesta edição mostram como o fotógrafo aborda os retratados e constrói sua narrativa. Uma trágica melodia também ecoa de outros dois ensaios da revista. Com uma obra extensa e uma carreira breve, Francesca Woodman transformou a câmera em sua melhor amiga. A fim de discutir a história de seu país, o libanês Walid Raad construiu ficções de guerra usando bombas que pareciam ter ficado para trás.

Em 1931, August Sander foi ao rádio para saudar o poder de comunicação da fotografia. Uma década depois, em plena guerra, o fotógrafo alemão seria perseguido e um lote de seu arquivo, destruído. Em homenagem a um dos maiores retratistas do século 20, ZUM publica em tradução inédita uma palestra crucial para entender o trabalho que Sander desenvolvia.

 

# 2

abril de 2012

Hotel Tropical, João Castilho & João Paulo Cuenca

Claro enigmaClaudia Andujar & Tales Ab’Sáber

A guerra conectada, Balazs Gardi, Teru Kuwayama, Rita Leistner, Omar Mullick & Leão Serva.

Isto não é o que parece, Thomas Demand & Peter Galassi

De olho na tragédia, Enrique Metinides & José Geraldo Couto e Thyago Nogueira

O inventor da fotografia em cores, William Eggleston & Thomas Weski

Duplos, anônimos, Terry Castle

Nova Luz, Mauro Restiffe & Heloisa Espada

Crer para ver, Errol Morris & Lawrence Weschler

Hotel Palenque, 1969-1972, Robert Smithson & Lorenzo Mammì

Erro permanente, Pieter Hugo & Fábio Zanini

O pecado original, Tazio Secchiaroli, Marcello Geppetti & Carol Squiers

A cara da irreverência, Ozualdo Candeias & Inácio Araújo

Retícula

Guilherme Maranhão

 

A FOTOGRAFIA ESTÁ NUA. É o que proclama esta nova edição da ZUM, em que a imagem será despida, revirada, bisbilhotada com minúcia e debatida com atenção.

Conhecida por transformar a fotografia em instrumento de luta política, Claudia Andujar é homenageada com duas séries pouco vistas. Na primeira, uma mulher ganha ares metafísicos com a sobreposição de cromos e filtros. Na segunda, o sujeito coletivo é contraposto ao céu da rua Direita, em São Paulo.

Até que ponto o que vemos independe do que acreditamos? Em entrevista exclusiva, o documentarista Errol Morris narra a obsessão detetivesca que o fez esclarecer controvérsias da história da fotografia e do jornalismo. Voz ilustrada, Errol enfrenta a qualidade documental da fotografia. Não, o que vemos não é o que pensamos ver. Senão, vejamos.

Notícia e denúncia, tecnologia e jornalismo travam embate em dois ensaios contundentes. Autor da capa desta edição, Balazs Gardi é membro do projeto Basetrack, que usa celulares com aplicativos para documentar um batalhão americano estacionado no Afeganistão e dá aos combatentes a chance de distribuir a informação. Em Gana, o sul-africano Pieter Hugo mostra a ponta obscura do consumo de eletrônicos num lugar onde computadores (como este, de onde escrevo) despachados pelo Primeiro Mundo dão o suspiro final. Trágicas e – reluto em dizer – belas são também as cenas de infortúnios do mexicano Enrique Metinides. Com absoluto domínio do drama, o fotógrafo eleva o patamar da reportagem policial.

A ideia de que a fotografia pode ser compreendida de forma imediata é desafiada por alguns destaques desta edição. O alemão Thomas Demand reconstrói em papel cenários extraídos de outras fotografias, num jogo que esconde e revela a imagem de partida. Já o americano Robert Smithson transforma sua deambulação pelo Hotel Palenque em aula seminal de arte e arquitetura. No time dos fotógrafos-peregrinos, a revista apresenta os hotéis de João Castilho e a caminhada de Mauro Restiffe, feita a convite da ZUM, pelo bairro paulistano da Luz, já dissipados os ecos de dias conturbadíssimos.

Raros fotógrafos são capazes de apresentar o mundo e ao mesmo tempo inventar uma realidade. É o que fez William Eggleston ao usar a fotografia em cores para palmilhar o sul dos Estados Unidos. Aqui, ele apresenta cromos guardados há cerca de 40 anos. Se a fina ironia de Eggleston o fizer sorrir, a ensaísta Terry Castle o fará gargalhar. A busca pelo punctum em sua coleção de fotografias anônimas é a prova de que humor e perspicácia dormem juntos.

De Errol Morris, vem uma das frases mais retumbantes da edição: “Falsas ideias grudam nas fotografias como moscas num papel mata-moscas”. Vire a página, e ajude a descolar as moscas e devolvê-las a seu devido lugar.

 

 

# 1

outubro de 2011

Floresta inundada, Luiz Braga & Joca Reiners Terron

Contra a imagem perfeita, Robert Frank & Luc Sante

Na antessala da morte: Retratos do genocídio do Camboja, Museu do Genocídio Tuol Sleng & Hugo Mader

Sem título, Miguel Rio Branco & Rodrigo Naves

A presença do invisível, Jeff Wall & Craig Burnett

Brasília, Juazeiro do Norte, São Paulo, Jorge Bodanzky & José Carlos Avellar

Como fotografar a rua sem sair de casa, Michael Wolf, Jon Rafman, Doug Rickard & Geoff Dyer

Fome de ver, Kohei Yoshiyuki & Bernardo Carvalho

Ramos, Julio Bittencourt & Joaquim Ferreira dos Santos

O instante decisivo, Henri Cartier-Bresson

O léxico industrial de Bernd e Hilla Becher, Ulf Erdmann Ziegler

A cavalo fotografado não se olham os dentes, Fábio D’Almeida

O instantâneo, Jonathas de Andrade & Vladimir Nabokov

Retícula, resenhas

Letícia Ramos

A FOTOGRAFIA É UM ACIDENTE. Não como sugere a imagem de Jeff Wall estampada na capa da revista. Mas semelhante a um incêndio, como este, garimpado nos arquivos do cineasta e fotógrafo Jorge Bodanzky. Do jornalismo à arte, das pesquisas científicas às redes sociais, de satélites a celulares, a fotografia tomou rumos inesperados e se alastrou como fogo.

ZUM é a revista semestral do Instituto Moreira Salles dedicada ao universo fotográfico. Estas páginas trarão ensaios visuais inéditos ou pouco conhecidos, acompanhados de artigos, entrevistas e textos fundamentais da história da fotografia. ZUM é também um campo de debate para a fotografia contemporânea, aberto a todos os que apostam na reflexão crítica e enriquecido por outras áreas, como o cinema, a literatura e as artes plásticas. Comentários iluminarão as imagens, como fazem o abajur de Autenticação ou o lustre de Ivan Sayers, em duas fotografias de Jeff Wall exibidas pela primeira vez.

Com um mundo requintado, Jeff Wall fincou os pés da fotografia na arte contemporânea. Seu contraponto na revista é a realidade excessiva das imagens dos prisioneiros do Camboja, escaneadas dos negativos originais. Documento terrível de um genocídio, a fotografia aqui tem de encarar uma questão ética fundamental.

Em veredas brasileiras, cruzaremos com a nova floresta verde de Luiz Braga, com a intimidade luminosa de Miguel Rio Branco e com as boias do piscinão de Ramos, fotografadas por Julio Bittencourt. A menção honrosa atribuída por uma premiação de fotojornalismo a uma série de imagens originalmente fotografadas pelos carros do Google não passa batida pelo escritor Geoff Dyer; do outro lado do mundo, o japonês Kohei Yoshyiuki tropeça em um novo tipo de voyeur. Robert Frank, que se afastou do mundo e da imagem perfeita depois de publicar The Americans, exibe seu estilo tardio em polaroides cotidianas e delicadas.

Fotografia também é palavra. A entrevista de Bernd e Hilla Becher é uma aula franca sobre as motivações do casal que permanece dando o tom da fotografia na arte contemporânea. Das folhas da história, Henri Cartier-Bresson expõe o talento de escritor. Bem-humorado, ele dizia ser responsável por fornecer informação a um mundo cacofônico e apressado, repleto de pessoas que precisam da companhia de imagens. Há pelo menos 60 anos, ele já falava de nós.