Revista ZUM 20

Gente de verdade

Paiter Suruí & Coletivo Ixomasoden Publicado em: 3 de julho de 2025

Na época em que foi feita esta foto de minha tia Elza Pamoga Suruí, meu povo já visitava a cidade. E a maioria tinha Rani (Registro Administrativo de Nascimento de Indígena), que é como um RG que a Funai faz para nós. Por isso, quando íamos fazer retratos na aldeia, muitas vezes tentávamos copiar o fundo de estúdio que víamos nos retratos dos brancos, mas a gente usava lençol ou qualquer pano grande.


Hoje somos cerca de 2 mil, e nosso território, a Terra Indígena Sete de Setembro, fica metade em Rondônia e a outra parte em Mato Grosso. Apesar de o nosso território ser demarcado e homologado, historicamente sofremos com invasores de todos os tipos, que atacam não só os indígenas como também as árvores. Desde a criação do universo, Palob, nosso Pai, nos fez filhos da floresta. Nossa espiritualidade está ligada à natureza, mas o contato com o mundo exterior causou grandes impactos sociais, culturais e ambientais. Além de resistir aos ataques, decidimos recuperar o que foi destruído pelo homem branco e criamos o projeto Pamine, “renascer”, em tupi-mondé. Desde então, plantamos mais de 500 mil mudas nativas em áreas desmatadas por invasores. Esta maloca foi construída para comemorar o início do reflorestamento.


Perpera foi um dos últimos pajés do povo Paiter Suruí. Durante as guerras contra outras etnias ou invasores brancos, ele fazia rituais para que nossos guerreiros não fossem mortos. Meu próprio pai já sobreviveu a várias batalhas graças à ajuda dele. Por muito tempo, Perpera Suruí era convidado a viajar para outras regiões a fim de realizar rituais de cura nas pessoas. Até que missionários estrangeiros entraram no nosso território, aprenderam nossa língua e traduziram livros inteiros da Bíblia para o tupi-mondé. Eles também espalharam que a pajelança não deveria mais ser feita porque era prática demoníaca. Depois de um tempo, Perpera virou cristão e foi abandonado pelos espíritos da floresta. Hoje, ele é o porteiro da igreja na aldeia Lapetanha. Esta foi a primeira vez que o nosso pajé foi à praia. Ele estranhou o gosto “ruim” daquela água.

Raimunda Cinta Larga segurando uma Bíblia. No passado, tivemos guerras com vários povos indígenas, inclusive aqueles que falam a mesma língua que nós, como os Ikolen Gavião, os Zoró e os Cinta Larga. Até hoje os mais velhos se lembram disso e contam histórias de batalhas – e alguns deles ainda são um pouco desconfiados com outras etnias. Atualmente não existe mais problema, e sempre nos encontramos em festas, casamentos, campeonatos de futebol e eventos da igreja.

Mopidmore e Yaminan estudavam na escola da cidade, então gostavam de tirar fotos com o uniforme, porque era algo muito diferente e importante para nós. Como a câmera passava pelas mãos de várias pessoas, alguns parentes não sabiam bem como fazer o enquadramento, mesmo assim as imagens eram motivo de orgulho, tanto que são bem guardadas até hoje.


Meu pai, Agamenon Suruí, fotografado pela antropóloga Betty Mindlin em 1977, na antiga aldeia. Após o contato, os Paiter Suruí rapidamente começaram a trocar o arco e flecha pela espingarda para caçar. Além das armas de fogo, muitos machados, facas e panelas eram roubados de seringueiros durante a colonização da região onde hoje vivemos. Meu avô pegou vários facões nos acampamentos dos seringueiros que invadiram nosso território. Na volta para a aldeia, os guerreiros cantavam sobre o acontecimento.

Meu irmão Mopidmore Suruí, um dos primeiros indígenas a estudar na escola de campo Monteiro Lobato, em 1998. Naquela época, ele e outros jovens das aldeias Lapetanha, Lobó e Tikã caminhavam diariamente dez quilômetros para chegar ao colégio, que ficava fora da Terra Indígena Sete de Setembro. Para aguentar todo o período longe de casa, eles levavam cará, mandioca, batata e carne de animais de caça. Além da distância, contam que as adversidades eram muitas. Entender as disciplinas e a explicação dos conteúdos em português era difícil, mas a pior parte era o preconceito com a nossa cultura, uma realidade ainda hoje presente nas escolas, universidades e lugares públicos.


Neste lugar aconteceu o primeiro encontro do meu povo com o homem branco. Esta é a aldeia Nabekodabalakiba, que significa “local onde foram pendurados os facões”. Deixar “presentes” na mata é até hoje uma tática utilizada pela Funai para se aproximar de povos isolados. Na época ainda jovens, Dikimatara e Gamina Suruí passaram a trabalhar na entidade indigenista, participando das expedições de contato com outras etnias, entre elas os Uru-Eu-Wau-Wau de Rondônia.

Este é o meu pai, Agamenon Suruí, participando de uma reunião na Escola Tancredo Neves, a primeira construída dentro da nossa terra. Naquela semana, os Paiter se juntaram para criar um plano de gestão territorial para o povo. Esse projeto foi desenvolvido com a Metareilá, a associação indígena mais antiga de Rondônia. A organização foi fundada pelos meus tios em 1989, e é onde eu trabalho hoje.


Onde hoje é minha comunidade, antes era uma vila de seringueiros, eles estavam dentro do nosso território e por isso foram expulsos. O local virou uma aldeia, mas as moradias dos brancos continuaram lá e foram ocupadas pelos indígenas. Por muito tempo, não tínhamos móveis, eram só as redes. Nossos pertences ficavam pendurados – como faziam nossos antepassados. A maior diferença é que não dá para fazer fogueira dentro de casa, e nenhuma delas é grande o suficiente para abrigar várias famílias juntas. Meu pai, que nasceu antes do contato, tem esposas e filhos em construções modernas, mas ainda hoje prefere dormir na maloca de palha e madeira.

Na nossa cultura, os homens podem ter várias esposas ao mesmo tempo. O primeiro casamento do meu pai, Agamenon Gamasakaka Suruí, foi com Elza Gobpodjog. Os dois aparecem na maloca da aldeia Lapetanha, onde vivemos até hoje. Agora ele é casado também com a minha mãe, Kabena Cinta Larga. Ao todo, somos 18 filhos. Antigamente, vivíamos todos juntos, às vezes até dez famílias por habitação. No dia desta foto, várias gerações de uma família estavam reunidas na mesma casa, e isso é um motivo de grande alegria para os Paiter.


O casal Napo e Pamoga durante o Mapimai – ritual em que comemoramos a criação do mundo. No passado, éramos divididos em vários clãs, mas as guerras e, principalmente, o contato diminuíram drasticamente nossa população. Hoje só restaram Gameb, Makor e Gabgir, todos de linhagem próxima, e Kaban, que surgiu de uma mistura com o povo Cinta Larga, etnia também falante do tupi-mondé. Nessas cerimônias, participam apenas dois grupos, que travam uma disputa com o uso da chicha, bebida fermentada que pode ser de mandioca, cará, milho ou batata-doce. O clã anfitrião prepara centenas de litros, e os convidados têm que beber tudo até o final, caso contrário são tidos como derrotados. Artesanatos devem ser oferecidos em troca da bebida, e a festa também envolve pintura, música e dança. Antes do contato, que aconteceu em 1969, o ritual era comum e durava várias semanas, mas hoje raramente acontece – o último foi em 2012.


Sandra Suruí ao lado da missionária Sônia. No passado, os religiosos entravam na Terra Indígena junto com a equipe do SPI (Serviço de Proteção ao Índio). Quase todos gostavam dos nossos colares e cocares, mas muitos reclamavam porque não usávamos roupas, e alguns criticavam até adereços como a pena no nariz e a betiga, que é um adorno de resina de jatobá colocado em um furo que fazíamos abaixo da boca.

Depois de aprender o idioma tupi-mondé, os missionários formaram pastores indígenas. São eles os responsáveis pelos batismos realizados na aldeia. Os cultos e cantos também são feitos na nossa língua. Hoje em dia, minhas irmãs fazem parte do coral da igreja, e a maioria dos jovens só conhece músicas religiosas e na língua do branco.


Esta imagem é da igreja batista na aldeia Lobó. A placa está em tupi-mondé e significa “Casa de adoração do povo de Deus”. Uma criança desenhou na foto a forma de um demônio para esconder o indígena que havia cometido homicídio dentro da comunidade. Ele e toda a família foram expulsos do território como forma de punição, por não terem seguido as regras da nossa cultura.

Casamento da minha irmã Eliza Sobitas Suruí. Na cultura Paiter, os casamentos só podem acontecer entre clãs diferentes. Por exemplo, minha irmã é Gameb e meu cunhado é Kaban – e os filhos seguem a linhagem do pai. Antigamente, as moças só se casavam com o tio materno; outros tipos de união só poderiam acontecer com a autorização dos irmãos da mãe. Mas desde o contato, em 1969, nosso ritual tradicional de matrimônio foi se acabando. Agora as cerimônias são todas realizadas nas igrejas, ou o casal simplesmente vai morar junto.


A região onde vivemos, entre Rondônia e Mato Grosso, é dominada principalmente pela produção de café e gado. Apesar de a minha aldeia não ser tão longe da cidade, nossa terra é cercada por grandes fazendas e sítios. Além disso, é uma área onde muita gente da região Sul do país veio começar uma nova vida no campo. Isso tudo faz com que essa cultura de caubóis esteja muito próxima da gente o tempo todo. De qualquer forma, os chapéus são bons para proteger do sol enquanto trabalhamos na roça, e as botas também ajudam bastante.

Luciana Suruí hoje mora na aldeia Gãkapi, que significa “roça antiga dos Paiter”. Esta fotografia está guardada com cuidado em um álbum da mãe dela, a Raimunda. As mulheres indígenas, quando se casam, têm que morar na comunidade do marido, que muitas vezes fica longe, por isso as mães guardam fotos com muito carinho para sentir a presença das filhas.


Desde o contato com os brancos, os missionários evangélicos vieram e converteram grande parte do nosso povo. A partir daí, a igreja nunca mais saiu da Terra Indígena Sete de Setembro, passando a dominar nossa cultura, nossas crenças e até a maneira como entendemos o destino de nossas almas após a morte. Agora, os pais quase que obrigam os filhos a irem para as igrejas desde cedo, pois acreditam que esse é o único caminho para a salvação.


Eu, meus irmãos Mopidgoe e Luan e meus primos, Mereweor e Oyyeimilor estávamos felizes pelas roupas novas que havíamos ganhado de nossos pais para comemorar o final de ano. Hoje em dia, acho que esta foto foi tirada para que os parentes pudessem zombar de nós no futuro, porque todas as famílias riem muito ao ver essas imagens e lembrar do passado. Antigamente não tínhamos datas comemorativas e contávamos o tempo da nossa maneira, por isso não sabemos exatamente quantos anos de vida têm muitos anciões do nosso povo. Diferentemente do homem branco, o calendário Paiter Suruí era definido pela nossa conexão com a floresta.

Marli e Talia Suruí durante arraial na Lapetanha. Os professores não indígenas da escola da aldeia organizaram uma festa junina em que os estudantes cuidavam e trabalhavam nas barracas para receber o restante da comunidade. A comida, as roupas e a maquiagem eram típicas da festa cristã, mas também tínhamos alimentação tradicional Paiter e nossa pintura corporal com jenipapo, porque ninguém queria deixar de mostrar a cultura indígena.


Meu irmão deitado na rede dentro de uma grande maloca na aldeia Lapetanha, em 1993. Se ainda hoje não nos adaptamos muito à cultura do branco, naquela época era bem pior. Como não tínhamos noção do que era dinheiro, após o contato, a vida nas comunidades foi ficando mais difícil. Meu tio Almir tirou esta foto para que no futuro pudesse mostrar ao meu irmão o quanto nosso povo foi evoluindo com o tempo. A fotografia também é uma maneira de vermos como nossos pais sofreram e nos educaram para nos tornarmos o que somos hoje.

Kelvin Suruí, neto da minha tia Raimunda Cinta Larga, foi o primeiro filho do meu primo Yabwar Suruí. O registro foi feito em um estúdio na cidade de Cacoal e entregue para a avó como presente. Antigamente, os Paiter não gostavam de tirar fotos, principalmente de crianças, pois acreditavam que a luz do flash eram espíritos malignos que captavam a alma deles. Hoje, com a facilidade de acesso à tecnologia, as fotografias se tornaram mais acessíveis ao nosso povo, e também usamos as câmeras dos celulares para chamadas com nossos parentes de outras aldeias.


Este é o time de futebol feminino da minha aldeia, formado pelas minhas irmãs e primas, Mari Goemaãd Suruí, Regina Hogab Gud Suruí, Aloma Mapinik Suruí, Celeste Paytxayed Suruí e Tonica Homagadje Suruí. Elas sempre participam dos jogos indígenas no município de Cacoal, onde jogam contra vários outros povos: Cinta Larga, Apurinã, Kawazá, entre outros. Há alguns anos o futebol feminino não era tão comum entre os Paiter Suruí, mas hoje quase todas as 27 aldeias do nosso território têm times de mulheres, e já existem até campeonatos internos na Terra Indígena.

Minhas primas Luciana e Marli durante sessão de fisioterapia em uma clínica na cidade de Cacoal. Quando criança, Marli tinha dificuldades para mexer o corpo. Muitos brancos dizem que os povos indígenas sacrificam as crianças com deficiência, mas essa prática não existe na cultura dos Paiter. Graças à fisioterapia, ervas medicinais e pajelança, hoje ela vive normalmente com a família. Inclusive, é uma das melhores zagueiras do time feminino da minha aldeia.


A constituição brasileira reconhece o direito de termos nossa organização social. Esta maloca foi construída para ser sede de eventos, cursos e reuniões. Nela se deu início à construção do Plano de 50 anos – projeto em que líderes e anciões definiram as diretrizes políticas e sociais para o futuro dos Paiter Suruí. Um dos idealizadores desse programa foi o meu tio Almir. Apesar das divisões dos quatro clãs, ele é uma das maiores lideranças de todo o território indígena e responsável por levar nosso nome a dezenas de países.

Luciana Suruí é filha da minha tia Raimunda Cinta Larga. Ainda nova, ela casou e se mudou para a capital Porto Velho para morar com o marido, que estava cursando direito. Na época, não tínhamos acesso a meios de comunicação. Por isso, uma das maneiras de matar a saudade era pelas fotos que ela mandava para a mãe. Hoje em dia, a família construiu para eles uma aldeia nova, que fica mais perto da nossa comunidade.


Uratûg, Tupinambá e Moyxîn comendo ingá nativo da floresta. A época dessa fruta era um momento de felicidade para nós. As famílias se reuniam e viajavam longe para comer direto das árvores no meio da mata. Muitos traziam balaios cheios para os que tinham ficado na aldeia. Com o tempo, fomos plantando frutas nativas mais perto de nossas casas.

Muitas imagens de antigamente foram estragando com o tempo, mas a gente guarda tudo mesmo assim. O meu povo entende a importância da fotografia. Parte da nossa cultura foi ficando apenas no passado, e muitas vezes os mais novos só conseguem entender melhor os costumes de antigamente por meio das fotos.

Tem homem branco que, quando olha uma árvore, só enxerga um toco de madeira e logo pensa em quanto dinheiro pode lucrar com aquilo. Na mesma situação, nós, indígenas Paiter Suruí, avistamos a vida, refletimos sobre os espíritos, contemplamos remédios e meditamos sobre Palob, o criador do universo. O tronco e as folhas não mudaram e nossos olhos são idênticos, mas o que vemos não é igual. No primeiro contato, em 1969, perguntaram quem éramos nós. Como não conhecíamos aquelas figuras exóticas, de pele clara e corpo coberto, respondemos: paiter suruí, que em tupi-mondé significa “gente de verdade”. Desde então, nossos mundos estão cada vez mais próximos e hoje podemos até falar a mesma língua. Porém, um mesmo cenário nos oferece significados tão distantes. Os olhares são diferentes.

Um dos grandes líderes do nosso povo é o meu tio Almir Narayamoga. Filho do guerreiro Marimop, que nasceu e viveu por muito tempo isolado na floresta, Almir entendeu que hoje é um novo tempo e os Paiter devem estar preparados para lutar não só com a flecha mas também com a tecnologia do branco. Depois de ser um dos primeiros a usar a internet, ele foi um dos responsáveis por trazer sinal de wi-fi para a aldeia. Trouxe ainda computadores, equipamentos modernos e vários convidados, entre jornalistas e lideranças de outros povos, até mesmo de outros países. Foi assim que acabei descobrindo a fotografia.

Com o tempo, entendi que a câmera pode ser uma ferramenta para defender meu povo de invasores e para proteger nossa cultura de ser massacrada ou esquecida. Na tradição Paiter, os mais antigos são os guardiões do saber. Todas as lições vêm deles, mesmo quando não estão falando. Aos mais jovens, cabe ter paciência, saber observar, respeitar e aprender. Mas eu sou o primeiro fotógrafo Suruí, então não havia quem me ensinasse técnica alguma – e nem possuía condições de pagar um curso na cidade, ou seja, parecia não ter muitas opções.

Para aprender sobre um assunto, o branco estuda sua história – e o Paiter busca as memórias de antigamente. Décadas atrás, missionários, antropólogos e jornalistas já entravam com câmeras no nosso território. Um desses equipamentos acabou ficando de presente na aldeia e passando por várias mãos. Daí surgiram as primeiras fotos feitas por nós mesmos, registros de cerca de 20 anos atrás. Para estudar fotografia, passei então a olhar também e principalmente para esse conjunto de imagens. Assim como o meu tio Almir disse que precisávamos aprender as ferramentas dos dois mundos, hoje eu busco aprender como os diferentes olhares atravessam a câmera, o que eles enxergam e como escolhem o que vai compor o quadro final.

Como os Paiter fazem tudo coletivamente, e a busca era por explorar visões distintas, um companheiro nessa pesquisa é o fotógrafo Gabriel Uchida, de São Paulo. Ele se mudou para a Amazônia em 2016, e desde então trabalhamos juntos. Foi Uchida quem me deu meu primeiro livro de fotografia, quando veio passar o final de ano na aldeia, em 2018 – mesma época em que começou a reunir fotos antigas de todas as famílias. Depois disso, ele também trouxe para o projeto a artista Maihara Marjorie, cearense que mora em São Paulo e já tinha experiência com povos do Xingu. Essas fotos foram coletadas em todas as casas da minha aldeia. Quando muitas delas foram feitas, eu era apenas uma criança. Assim, para entender melhor o que estava vendo e o porquê de cada registro, passei a ir atrás dos personagens ou seus familiares. Às vezes, a fotografia era brincadeira de curumim ou até um disparo acidental de alguém que não estava tão acostumado com a câmera. Mas, como a máquina era analógica, com a limitação dos filmes, a maioria dos cliques era de momentos realmente importantes, cenas que se tinha vontade de guardar para o futuro – mesmo que parecessem rotineiras, como o ato de deitar em uma rede.

O acervo catalogado já passou das centenas de registros, e cada um deles traz outra centena de narrativas. Quando um álbum novo é encontrado na aldeia, vários parentes se sentam em volta dele para trocar relatos e lembrar do passado. As fotos contam muito, até quando não mostram algo, pois a falta também tem um significado. De qualquer forma, graças aos retratos, essas memórias podem continuar vivas. Atualmente eu registro todas as nossas atividades e os nossos projetos. Espero que, a partir do meu trabalho, as próximas gerações possam ver como é a vida hoje. Nestes novos tempos, a fotografia é uma forma de resistência para os povos indígenas do Brasil. ///

Imagens cedidas pelos Paiter Suruí e pelo Coletivo Ixomasoden (Almas Perdidas), formado por Ubiratan Suruí, Gabriel Uchida e Maihara Marjorie. Reproduções de Gabriel Uchida.

Ixomasoden (Almas Perdidas) é um coletivo formado pelos fotógrafos Gabriel Uchida, paulista, Maihara
Marjorie, cearense, e Ubiratan Gamalodtaba Suruí, da aldeia Lapetanha, em Rondônia.


Tags: , ,