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Começa hoje a SP-Arte/Foto 2018, com a participação do curador Malcolm Daniel e do historiador Rodrigo Orrantia

Publicado em: 23 de agosto de 2018

Rosângela Rennó. Galeria Vermelho.

Começa hoje em São Paulo a 12ª edição da SP-Arte/Foto, um dos principais eventos nacionais de fotografia, com exposições, lançamentos de livros e debates com curadores e artistas. ZUM conversou com dois convidados internacionais, o norte-americano Malcolm Daniel, curador de fotografia do Museu de Belas Artes de Houston e ex-diretor curatorial do Met de Nova York; e o colombiano Rodrigo Orrantia, curador e historiador da arte que atualmente reside e trabalha em Londres.

Na SP-Arte/Foto, Malcolm Daniel conversa com pesquisadora brasileira Fabiana Bruno sobre a pós-fotografia; e Rodrigo Orrantia divide a mesa com o fotojornalista Evandro Teixeira para falar sobre as manifestações de 1968 no Brasil e na América Latina. Além deles, participarão do ciclo de palestras do evento o editor francês Pierre Bessard (junto com a artista Claudia Jaguaribe); o fotojornalista Gabriel Chaim (com a jornalista Patrícia Campos Mello) e os fotógrafos Bob Wolfenson e Jonathas de Andrade.

 

Entrevista com Malcolm Daniel:

Na sua visão, quais os principais desafios das instituições artísticas para receber em seus acervos e espaços expositivos os artistas da nova era da imagem digital e da pós-fotografia?

Malcolm Daniel – Essa é uma boa pergunta e, para mim, a resposta tem duas partes. Primeiro, acho que é o mesmo desafio que qualquer curador de arte contemporânea – fotográfica ou não – enfrenta, que é como julgar de uma maneira que não seja puramente subjetiva quando ainda não se tem uma perspectiva de tempo. A maioria dos curadores são treinados como historiadores de arte… nós estudamos história. Fazemos perguntas sobre patrocínio e recepção. Observamos a influência de um artista nos outros. Olhamos para a carreira completa de um artista para ver se existe um nível sustentado de criatividade ou se foi apenas o caso de “um sucesso único”. Podemos olhar para trás e ver se questões, eventos e movimentos sociais que afetaram o curso da história se refletem no trabalho. Na arte contemporânea de qualquer tipo, isso é mais difícil. Não podemos saber se um artista no início de sua carreira continuará a fazer um trabalho desafiador por mais uma década ou duas. Podemos pensar que entendemos nosso próprio zeitgeist, e até podemos… mas talvez não.

Os curadores dos principais museus têm um histórico muito bom, e gostamos de pensar que é por causa de nosso excelente julgamento e compreensão presciente do mundo e da arte, mas certa parte desse sucesso tem a ver com uma profecia autorrealizável. Um artista que, no início de sua carreira, tem uma exposição individual no MoMA, no Met ou outro grande museu é abençoado com a aprovação do establishment. E em breve outros museus e colecionadores vão querer possuir ou mostrar o trabalho do artista também. A aquisição de um museu, ou uma exposição, ajuda a impulsionar o artista para o sucesso que, por sua vez, valida o julgamento inicial do curador. Eu acho que a maioria dos artistas revisa seu site ou currículo no mesmo dia em que seu trabalho é adquirido por um museu. É um pouco o mesmo dilema do antropólogo – sua mera presença altera a sociedade que está estudando. Então, em suma, o curador da arte contemporânea toma decisões mais subjetivas que o historiador; ele ou ela talvez seja mais um crítico do que um historiador, mas espera-se que o conhecimento da história da arte faça com que esse julgamento subjetivo não pareça arbitrário.

A segunda resposta à sua pergunta é de fato única para a fotografia, e tem a ver com o grande volume de produção. Não estou preocupado se uma imagem foi alterada digitalmente. Nós não somos empresas de notícias, somos curadores de museus. Mas o digital trouxe um dilúvio de imagens e um mundo em que todos podem tirar uma foto. Quantas pinturas foram feitas ao longo de toda a história? Não sei a resposta, mas aposto que mais fotos são enviadas para o Instagram a cada hora. O quanto podemos escolher de tudo isso? O que acontece é um processo de seleção, e os curadores acabam vendo e considerando o trabalho de artistas que já passaram pelo filtro de galeristas, publicações especializadas, escolas de arte ou recomendações de outros colegas curadores.

Você tem alguma expectativa nessa vinda ao Brasil? Como a fotografia brasileira atual é vista desde o exterior?

MD – Para ser honesto, minha expectativa é ver muitos trabalhos de artistas com os quais ainda não estou familiarizado. Claro que conheço os grandes nomes já reconhecidos internacionalmente – Vik Muniz, Sebastião Salgado, Mário Cravo Neto, Miguel Rio Branco. E no Museu de Belas Artes de Houston temos fotografias de artistas que confesso são menos familiares para mim – Roberto Steizer, Fernando Laszlo, Jair Lanes, Cássio Vasconcellos, José Diniz, Vicente de Mello e outros. Estou realmente ansioso para encontrar artistas, galeristas, colecionadores e curadores em São Paulo, tanto na SP – Arte/Foto quanto em outros locais, para ampliar a conexão que o Museu de Belas Artes de Houston já tem com o Brasil e a América Latina. Fico com vergonha de dizer que em todos os meus anos no Met, Vik Muniz e Miguel Rio Branco foram os dois únicos fotógrafos brasileiros contemporâneos na coleção. Sinto que em Houston já estamos melhor em nossa tarefa de representar o que está acontecendo aqui, e esta viagem vai me ajudar a nos mover ainda mais em direção a esse objetivo.

Existe algum fotógrafo brasileiro em particular que você esteja interessado em conhecer melhor o trabalho?

MD – Não. Estou mais interessado em conhecer o trabalho de fotógrafos que ainda não tenho contato, de artistas que nunca ouvi falar antes. É a sensação de descoberta que será mais emocionante e recompensadora.

 

Entrevista com Rodrigo Orrantia:

Qual você acredita ser o principal legado das manifestações e protestos de 1968, que ocorreram em toda a América Latina, para as artes em geral e a fotografia em particular?

Rodrigo Orrantia – Um dos legados mais importantes dos movimentos de 68 foi a possibilidade de mudar o mundo. A força para resistir a anos difíceis de repressão e violência veio da esperança, da possibilidade – mesmo que minúscula – de que o futuro pudesse ser mais socialmente justo, com liberdade e tolerância. As artes, e especialmente a fotografia, ajudaram a difundir essa mensagem de resistência – para mostrar que havia dissidências, mundos ocultos e, de certo modo, a possibilidade de se expressar livremente usando códigos visuais e uma linguagem artística muito sofisticada.

Você tem alguma expectativa nessa vinda ao Brasil? Como a fotografia brasileira atual é vista desde o exterior?

RO – Tenho grandes expectativas de voltar ao Brasil, quase 20 anos depois da minha última visita. O cenário na América Latina mudou radicalmente, e eu tive o privilégio de trabalhar com curadores e artistas brasileiros nos últimos anos que abriram meus olhos para uma história fascinante de arte e fotografia no país, uma produção contemporânea excepcional. Curadores como Iatã Cannabrava, com o Festival de Paraty em Foco, e projetos editoriais de Claudi Carreras e Claudia Jaguaribe foram muito importantes para mim, levou boa parte da produção brasileira para a Paris Photo, uma das referências mais importantes para a fotografia na Europa. Nos últimos anos, espaços reconhecidos de arte e fotografia em Londres apresentaram exposições de artistas como Rosângela Rennó (na Photographer’s Gallery) e Mario Cravo Neto (no espaço Autograph ABP). Fiquei muito animado em ver a recepção desses trabalhos em Londres. Neste momento, há um interesse muito evidente pela América Latina e a possibilidade de revisitar e reescrever essa história através da imagem visual. Para mim, o Brasil ocupa um lugar especial, com uma história muito particular, desde os experimentos de Hércules Florence, no século 19, até a produção contemporânea da geração de artistas mais jovens que estou começando a conhecer. Espero ver muitos nomes novos na feira e ser um bom embaixador do Brasil em Londres.

Existe algum fotógrafo brasileiro em particular que você esteja interessado em conhecer melhor o trabalho?

RO – Há uma lista de galerias com uma proposta muito interessante e que participam da SP – Arte/Foto pela primeira vez. A Fortes D’Aloia & Gabriel apresenta obras do Mauro Restiffe, e também destaco a galeria Emmathomas e a Silvia Cintra + BOX 4. Sou muito interessado pelo tema da natureza, além das ligações entre fotografia e escultura, então tenho muito a percorrer pelo Brasil. Estou trabalhando na curadoria de uma exposição na galeria Eduardo Fernandes, e gostaria de conhecer o seu espaço e os artistas brasileiros que representa. E também alguns nomes mais estabelecidos, que têm participado seguidamente, como a Vermelho e os trabalhos de Claudia Andujar e Jonathas de Andrade; e a galeria Leme, com artistas como Mariana Mauricio, com quem trabalhei em projetos aqui em Londres. Espero, no entanto, que este ano eu tenha muitas surpresas e novos encontros, artistas que não vi antes, para estabelecer novas ligações em Londres e na Europa.

Veja abaixo galeria de imagens com alguns destaques desta edição da SP-Arte/Foto.///

 

Mais informações sobre a programação completa da SP-Arte/Foto aqui.

 

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