Curadora Sarah Meister fala sobre exposição de Grete Stern e Horacio Coppola no MoMA
Publicado em: 18 de maio de 2015Grete Stern (1904-1999) e Horacio Copolla (1906-2012) devem a sua união amorosa a uma convicção artística comum. Ambos se encontraram pela primeira vez em 1932, na Escola de Bauhaus, em Berlim. A conduzi-los, existia a ideia de que a fotografia era uma mídia pouca explorada. Na verdade, Stern e Coppola a consideravam uma arte com uma linguagem própria, mas ainda por ser inventada.
Da Bauhaus a Buenos Aires: Grete Stern e Horacio Coppola, exposição que acaba de ser inaugurada no Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), em cartaz até 4 de outubro, explora os trabalhos conjuntos e independentes do casal. O museu nova-iorquino reuniu cerca de 300 obras de Stern e Coppola, alunos de Walter Peterhans, responsável pelo curso de fotografia da Bauhaus.
Stern, uma alemã, e Coppola, um argentino, deixaram a Bauhaus em 1933, quando Adolf Hitler chegou ao poder, e se estabeleceram em Londres. Dois anos depois, eles partiram para a capital argentina, onde morariam até morrer. Com o incentivo crucial de Victoria Ocampo, escritora que fundou a revista Sur em 1931, a produção do casal tornou-se conhecida entre os intelectuais locais, como o escritor Jorge Luis Borges. Uma exposição na redação da Sur em 1935 fez a fotografia argentina entrar na era moderna, segundo a curadora de fotografia do MoMA Sarah Meister.
Uma das responsáveis ao lado de Roxana Marcoci pela curadoria de Da Bauhaus a Buenos Aires, Meister afirma que a parceria profissional e amorosa de Stern e Coppola, que se separam em 1943, é praticamente desconhecida nos Estados Unidos. A curadora trata a exposição como uma oportunidade para conhecer o feminismo pioneiro de Stern e o experimentalismo formal de Coppola.
A artista alemã e a sua colega Ellen Auerbach fundaram a agência ringl + pit nos anos 1920. Juntas, desafiaram as noções então preponderantes sobre fotografia e publicidade. Influenciado pelo cinema e pelo surrealismo, Coppola retratou Buenos Aires com a preocupação de explorar o potencial metafórico dos seus retratos, segundo Meister. A exemplo de Brassaï em Paris, Bill Brandt em Londres e Berenice Abbott em Nova York, ele evitou uma perspectiva neutra. Coppola entendeu que a capital argentina existiria em imagens filtradas pelo olhar independente de um artista. Leia a seguir trechos da entrevista de Meister à ZUM.
Da Bauhaus a Buenos Aires: Grete Stern e Horacio Coppola é a primeira exposição nos Estados Unidos que aborda conjuntamente os trabalhos de Stern e Coppola. Há elementos das fotografias do casal que foram ignorados com o tempo?
O público americano ignora até hoje muitos aspectos dos trabalhos de Stern e Coppola. Embora os retratos feitos por Stern sejam uma parte importante da sua produção, eles são pouco conhecidos nos EUA. Quanto a Coppola, ele é um completo desconhecido por aqui. Além da do MoMA, ele não quase aparece nas principais coleções de fotografia dos EUA. Toda a sua carreira como fotógrafo vai ser uma surpresa.
O MoMA em seu material de divulgação anuncia Da Bauhaus a Buenos Aires como uma exposição sobre a fundação da fotografia moderna na América Latina. Por que a curadoria trata Stern e Coppola como os precursores dessa arte?
Nós usamos como evento inspirador a exposição do trabalho de Stern e Coppola na redação da revista Sur, realizada em Buenos Aires, em 1935. O que argumento é que essa exibição anunciou uma nova era da fotografia moderna na Argentina, acontecimento que ainda hoje é assim considerado. Ao mesmo tempo, acho interessante o jeito como cada país da América Latina tem um modernismo com uma narrativa diferente e com a sua própria história. Não há sempre uma coincidência entre esses países. Na verdade, não tenho certeza sobre a afirmação de que eles seriam os fundadores da fotografia moderna na América Latina, mas apenas na Argentina.
Criado em uma família rica, Coppola pôde estudar línguas, filosofia e artes. No fim dos anos 1920, antes de se mudar para a Alemanha e estudar na Bauhaus, ele tirava fotos que mostravam o seu interesse pelo potencial metafórico e visual das imagens. O que explicaria o experimentalismo de Coppola anterior à Bauhaus?
Eu não definiria a família de Coppola como rica. Diria que ela era financeiramente confortável, capaz de lhe oferecer a oportunidade de estudar. Para mim, é impossível entender o experimentalismo de Coppola antes de ele ir para a Bauhaus sem observar a relação dele com o cinema. Coppola falava muito de filmes e foi um dos fundadores do cineclube de Buenos Aires. O cinema é a mídia que tem a maior influência na sua experimentação com fotografias no fim dos anos 1920.
Qual foi a importância de Vitoria Ocampo, escritora que fundou a revista Sur, para a carreira de Coppola como fotógrafo?
Boa parte do que se sabe sobre a relação intelectual de Ocampo e Coppola foi reconstituída muitas décadas depois. É claro que o fato de as fotografias de Coppola serem publicadas pela revista Sur revelou-se como uma oportunidade importante para o fotógrafo argentino divulgar o seu trabalho no início dos anos 1930. Ocampo foi essencial para apresentar o trabalho de Coppola a um público mais amplo e por promover criticamente a noção de que as imagens fotográficas têm uma motivação artística.
Stern e Coppola fundaram a maior parte da sua produção na Argentina entre os anos 1930 e 1950. Em que medida a cultura local influenciou as fotografias de ambos?
Quando se mudaram para a Argentina nos anos 1930, Stern e Coppola se integraram a uma cultura local altamente sofisticada. Eles se envolveram com um círculo intelectual formado por escritores, filósofos, arquitetos. É quase impossível entender as suas realizações sem levar em conta as influências locais.
Grete Stern e a sua colega Ellen Auerbach fundaram a agência publicitária ringl + pit nos anos 1920. Para Stern e Auerbach, arte e comércio não eram fenômenos antagônicos; deveriam ser usados para abordar temas como a feminilidade. Elas podem ser consideradas protofeministas?
Stern e Auerbach estavam envolvidas com a busca pela perspectiva de uma nova mulher. Elas precisavam encontrar uma linguagem inovadora que encadeasse os elementos publicitários e sua visão pessoal. O seu trabalho é protofeminista, precursor, porque está ligado à percepção que Stern e Auerbach tinham de si mesmas como mulheres e artistas.
A relação profissional entre Auerbach e Stern é mais conhecida nos EUA do que a parceria artística entre Coppola e Stern?
A relação entre Auerbach e Stern é mais conhecida, embora eu tenha a expectativa de que Da Bauhaus a Buenos Aires ajude a entender melhor não só a parceria entre Stern e Coppola, mas a produção conjunta das duas colegas. A colaboração entre Stern e Coppola se desenvolve depois de os dois iniciarem cada um a sua carreira, mas tal fato não impede que mantenham influência mútua ou convicções comuns entre os anos 1930 e 1940, como mostra Jodi Roberts em um ensaio do catálogo da exposição. Eles administram juntos um estúdio em Buenos Aires. Mas a relação entre Stern e Auerbach foi mais crucial para o trabalho que ambas desenvolveram posteriormente. Quando Coppola e Stern passam a colaborar, é preciso lembrar que os dois são já artistas com realizações próprias e uma formação inicial independente.
As fotos mais famosas de Coppola retratam as ruas de Buenos Aires. Jorge Luis Borges, um admirador, usou a obra de Coppola para ilustrar a primeira edição de seu livro sobre o poeta Evaristo Carriego. Qual é a perspectiva do fotógrafo argentino em relação à sua cidade?
Coppola procurou mostrar a textura da cidade argentina de acordo com uma perspectiva semelhante à dos fotógrafos mais influentes da primeira metade do século 20: o jeito de olhar de Brassaï para Paris, ou o modo como Bill Brandt observou Londres, ou a maneira pela qual Berenice Abbott enxergou Nova York. Ele estava tentando apresentar não só a composição física de Buenos Aires, mas também a energia da cidade segundo o seu ponto de vista sobre os eventos urbanos. Coppola entendeu que apenas com uma visão bastante pessoal, e não uma abordagem neutra ou remota, ele poderia contribuir para um outro entendimento sobre Buenos Aires, assim como ilustrar as possibilidades oferecidas pela fotografia como uma expressão artística independente.
Da Bauhaus a Buenos Aires vai apresentar as fotografias das obras de Aleijadinho tiradas por Coppola?
Nós incluímos no catálogo da exposição algumas dessas fotografias, que são maravilhosas. Nós nos esforçamos nessa exibição para apresentar sempre que possível os trabalhos em um formato vintage. Por essa razão as imagens das obras de Aleijadinho vão ser representadas no livro, mas não na exposição.///
IMAGENS © Estate of Horacio Coppola