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Da arte postal às mídias sociais: o compartilhamento de fotografias é tema de exposição no SFMoMA

Publicado em: 7 de maio de 2019

Philippe Kahn, Foto do nascimento de Sophie Lee Kahn, primeira fotografia compartilhada instantaneamente através de uma câmera digital, telefone celular e servidor com 2 mil pessoas, 11 de junho de 1997, 1997, cortesia da Fundação Lee-Kahn © Philippe Kahn

No dia 11 de junho de 1997, o engenheiro de software francês Philippe Kahn enviou para amigos e familiares uma foto bastante granulada da sua filha Sophie, nascida momentos antes, usando um cabo feito por ele mesmo para conectar seu celular a uma câmera digital e à internet. Esse momento foi marcante na história do compartilhamento de fotografias, algo inerente ao meio desde a sua criação, ao inaugurar, mesmo que de forma caseira, a tecnologia que resultaria nas plataformas digitais de troca de imagens.

Esse gesto de trocar, compartilhar e enviar fotografias é o tema da exposição snap+share: transmissão de fotografias da arte postal às mídias sociais, em cartaz no SFMoMA de San Francisco (EUA). A mostra explora desde os trabalhos iniciais de importantes artistas (principalmente americanos) da arte postal até o atual momento de intensa troca de memes, fotos e vídeos em todo mundo, com trabalhos de artistas que fazem uso dessas plataformas e tecnologias.

ZUM conversou com Linde B. Lehtinen, curadora assistente de fotografia do SFMoMA, sobre arte postal, a interação cada vez maior entre o público e os museus e as principais tendências da arte digital em tempos de mídias sociais.

 

Artista desconhecido, sem título, circa 1920–60, Museu de Arte Moderna de San Francisco, doação de Peter J. Cohen

 

Museus ao redor do mundo estão se abrindo cada vez mais para exposições relacionadas a arte digital, memes, redes sociais e interatividade, com diferentes abordagens e objetivos. Qual a abordagem da exposição snap + share? Que tipo de reações/interações ela quer ter com o público?

Linde Lehtinen: O que torna essa exposição diferente de outras mostras sobre a internet é que ela adota uma abordagem decididamente histórica, colocando esse material dentro de uma certa trajetória relacionada ao gesto e ao ato de compartilhar e enviar fotografias, do século 19 até o presente. Tem um leque de trabalhos, da fotografia analógica à fotografia digital, dos primeiros cartões postais e da arte postal até projetos mais contemporâneos. A exposição inclui uma linha do tempo de compartilhamento de fotografias que registra alguns dos primeiros exemplos e invenções que levaram ao que vemos na fotografia digital e nas mídias sociais de hoje. Por exemplo, existe uma conexão entre os primeiros instantâneos amadores com o “eu” inscrito neles e a hashtag de selfie no Instagram.

Até agora, as reações dos visitantes têm sido extremamente positivas. Muitos estão interagindo com diferentes partes do programa, incluindo o projeto “cabeça-no-freezer” do artista David Horvitz, que convida os visitantes a criar memes; ou tirando e compartilhando fotos da obra Gato no teto, da dupla Eva e Franco Mattes; ou ainda enviando cartões postais da fotografia da Ponte Golden Gate da artista Corinne Vionnet que disponibilizamos para os visitantes levarem e compartilharem. Por toda a exposição, a fotografia é usada de forma a estimular os visitantes a continuarem enviando e compartilhando novas fotografias de várias maneiras.

 

Em Kawara, Eu me levanto…, 1975, Robert Harshorn Shimshak & Marion Brenner © One Million Years Foundation, cortesia da One Million Years Foundation e David Zwirner

Uma parte importante da exposição é dedicada à arte postal dos anos 1960 e 70. Esses trabalhos estão ali como precursores ou como contraponto à arte digital?

LL: A atividade dos artistas postais realmente antecipa a internet de várias maneiras em termos de criação de redes e comunidades, interligando países e compartilhando ideias e obras de arte através do correio, semelhante ao modo como usamos e-mail e mídia social hoje. A arte postal na exposição também reforça a fotografia como um meio muito democrático, acessível a muitos criadores e espectadores diferentes. A arte postal contém componentes muito materiais e tangíveis, em contraste com a natureza efêmera da internet e dos conteúdos de mídia social. É simplesmente uma maneira diferente de se comunicar e compartilhar, não necessariamente um contraponto direto ao digital.

 

Aram Bartholl, Mapa, 2019 (instalação, SFMOMA), cortesia do artista, Hello world! -® Nils Klinger © Aram Bartholl, foto de Katherine Du Tiel

O que você entende como principal característica da arte em tempos de mídias sociais?

LL: Hoje em dia as experiências artísticas podem ser compartilhadas de maneira bastante aberta e frequente através das mídias sociais – Facebook, Instagram, Snapchat, etc – que podem servir como uma plataforma específica para compartilhar diferentes aspectos da arte visual. Muitos artistas que trabalham com a internet têm uma relação de amor e ódio com ela. Compartilhar imagens dessa maneira pode rapidamente se tornar viral, mas também pode levar a uma perda de materialidade e conexão. É essa mesma tensão que muitos artistas continuam a interrogar. Aram Bartholl, por exemplo, usa e critica a cultura da internet em obras como Mapa, que explora a onipresença de certos símbolos digitais como o pin do Google Maps, transformando-o em uma escultura de nove metros instalada no topo do museu e no coração do mundo da tecnologia aqui em San Francisco. Mas ele também recicla grande parte de seu trabalho nas mídias sociais, uma forma de ver e analisar como essas informações são compartilhadas e consumidas. A troca não acontece apenas em mão única.

 

Ray Johnson, sem título (Ray Johnson com Dina Merrill), 1967/1974/1976, Museu de Arte Moderna de San Francisco, aquisição por troca e doação de Evelyn D. Haas © Espólio de Ray Johnson

Falando especificamente da fotografia “clássica”, quais seriam as principais ameaças e oportunidades para essa mídia na disputa por espaço e visibilidade em museus e instituições artísticas?

LL: Essa tensão e mesmo interação entre a materialidade da fotografia impressa e a fotografia efêmera ou digitalizada em uma tela é parte do que torna esse momento cultural tão fascinante e complexo. Ao incluir artistas que confiam tanto na internet para o conteúdo, mas que também estão profundamente enraizados no mundo das artes, o museu está abrindo a conversa sobre a validade de ambas as abordagens. A exposição cria um espaço para a fotografia analógica e digital e também as interconecta conceitualmente.

 

Quais trabalhos da exposição você destacaria como tendências no campo da arte digital?

LL: Há várias tendências na exposição: a tensão entre estruturas materiais tangíveis e o espaço amorfo e imprevisível da internet, como no trabalho 24HRS em fotos de Erik Kessels; a experiência da perda de controle, seja enviando fotografias pelo correio para ver o que acontece com elas (na arte postal/performance Querida fotografia, de Peter Miller) ou divulgando instruções para o público para ver como elas serão encenadas ou executadas (241543903 de David Horvitz); e a questão da vigilância, como nas obras phonelovesyoutoo (matrix) de Kate Hollenbach e Gato no teto, de Eva e Franco Mattes.///

 

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