O trabalho do artista visual e fotógrafo João Castilho explora, segundo suas próprias palavras, “questões existenciais e políticas da vida e da morte, da inocência e da culpa, da pulsão e do medo, da sobrevivência e da extinção através da paisagem, da cor, dos seres vivos e outros seres”. Formado em comunicação visual pela PUC-MG e mestre em artes visuais pela UFMG, Csatilho é autor de Paisagem submersa (Cosac Naify, 2008) e fez residências artísticas no Brasil, Mali e França. Seu trabalho foi exibido em coletivas e individuais em diversos países, do Japão à Bolívia. Nos últimos anos, tem trabalhado com séries de fotografias, fotoinstalações, vídeos e esculturas, realizando obras com inspiração “na literatura, na arte, na atualidade e em sua própria história, oscilando entre uma memória pessoal e uma memória coletiva”, afirma.
Em Zoo, projeto desenvolvido para a Bolsa ZUM de Fotografia 2013, parte de uma premissa que considera “simples”: o deslocamento de animais selvagens e silvestres para serem fotografados em ambientes domésticos. A intenção, afirma, é “discutir as questões em torno da animalidade e abrir uma porta para a investigação do que chamei de mistério humano”.//
Leia a entrevista com João Castilho:
No projeto de Zoo, você se refere à recorrência da imagem do animal na arte contemporânea, como uma espécie de “espelho do mistério humano”. O projeto tem um fundo filosófico, conceitual. Como foi o processo de conceber e realizar o projeto?
João Castilho: No ponto de partida de um projeto como esse está frequentemente um amálgama de referências. Sem dúvida a literatura animal, a zoopoética e a filosofia que também vai por esse caminho foram bem importantes. A partir de Zoo fiz uma série de trabalhos que abordam a questão animal: Marca Infinita (2017), Passos Fósseis (2017), Torres (2017), Nova Era (2016), Blocos (2016), DinheiroPintado (2015), Cão (2015), Irreversíveis (2014).
Encontrar os animais foi uma etapa lenta e trabalhosa. As seções de fotografia, ao contrário, foram rápidas, com poucos segundos ou minutos para realizar a foto. Não podia trabalhar com qualquer animal, tinha que ser o animal certo, em uma colaboração bem próxima com o cuidador do bicho.
A dificuldade maior era encontrar um animal que fosse possível deslocar para uma locação e que pudesse ser fotografado em segurança. E isso independe da espécie. Às vezes conseguimos fotografar um determinado tamanduá de um lugar, e outro não. É caso a caso.
As opções formais (enquadramento, luz etc.) e os formatos utilizados (digital, negativo etc.) foram definidos de antemão, ou emergiram ao longo do projeto?
JC: O primeiro passo no trabalho de campo era escolher a locação, normalmente o lugar mais próximo do recinto do animal, porque não tínhamos como fazer grandes deslocamentos. Eu trabalhava com o que encontrava nos lugares: salas, quartos, garagens, cozinha, banheiro, sofás, camas, cadeiras, cortinas e sempre com a luz que estava lá, luz natural. Usei uma câmera digital, e as impressões têm formatos variados, uma dimensão para cada animal.
O projeto teve alguma continuidade?
JC: Ampliei o projeto ainda durante sua realização. Estava previsto para ser realizado em um ano, mas acabei levando três (2014-16) e em 2017 publiquei o ensaio completo em um fotolivro, que também não estava previsto.
Atualmente estou trabalhando em um grupo de fotoinstalações que tem como questões gerais a paisagem entrópica mineira, a arte, e o território ainda preservado no quadrilátero ferrífero. Essa área extensa, que vai de Brumadinho a Itabira passando por Congonhas, Mariana e Ouro Preto, abriga a maior concentração de minas a céu aberto do mundo e um importante e valioso acervo de barroco e arte contemporânea. Até o momento foram feitas quatro fotoinstalações: Ganga Bruta, Montanha Mágica, Morro Vermelho e Água Viva. Está prevista também uma série de fotografias.
Há alguma imagem de Zoo que você considera mais representativa do conceito geral?
JC: O Zoo é um trabalho em que cada imagem representa bem a proposta de todo o projeto. As imagens funcionam bem sozinhas. Não é um ensaio que quer contar uma história, não é narrativo. Tudo está contido em cada imagem. Mas poderia apontar aqui as fotografias da onça parda e a do tatu. São duas imagens que apresentam bem as questões de estranhamento e cor que perpassam todo o ensaio.///
João Castilho (Belo Horizonte/MG – 1978) é artista visual, trabalha com fotografia, vídeo e instalação. Realizou diversas exposições individuais e coletivas no Brasil e no exterior. Recebeu os prêmios Funarte Marc Ferrez de Fotografia em 2010 e o Prêmio Conrado Wessel de Arte em 2008. É graduado em Comunicação e Artes pela PUC-Minas, mestre em Artes Visuais pela UFMG e especialista em Artes Plásticas e Contemporaneidade pela Escola Guignard.
Leia também a entrevista com João Castilho sobre o fotolivro Zoo.
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João Castilho (Belo Horizonte, MG, 1978) Realizou exposições individuais no Instituto Tomie Ohtake (São Paulo), no Museu de Arte da Pampulha (Belo Horizonte) e na Fundação Joaquim Nabuco (Recife). Participou da 10a Bienal do Mercosul (2015), da 19a Bienal Sesc Videobrasil (2015), da 8a Bienal Internacional de Curitiba (2009). Publicou os fotolivros Zoo, Hotel Tropical, Peso Morto e Paisagem Submersa. É doutorando e mestre em Artes pela UFMG.