Retrospectiva 2024: os destaques do site da ZUM
Publicado em: 2 de janeiro de 2025Um prompt na tela e uma ideia na cabeça por Giselle Beiguelman
Para a colunista Giselle Beiguelman, a chegada do Sora, novo modelo da OpenAi que permite criar vídeos de até 60 segundos a partir de textos, impacta profundamente nossas concepções de audiovisual e marca uma virada tecnológica nada desprezível.
“Isso nos mostra que o audiovisual baseado em comandos de texto pode ser uma revolução muito mais profunda que o virtuosismo técnico implicado no desenvolvimento dos novos modelos de IA aponta.”
Retratos em disputa: a ditadura e a perseguição LGBTQIA+, por Renan Quinalha
Trabalhando em conjunto com o Memorial da Resistência de SP, o pesquisador e professor de direito Renan Quinalha resgatou do Arquivo Público do Estado de São Paulo dezenas de fotografias de pessoas que hoje chamaríamos de LGBTQIA+.
São fotos de fichamentos policiais, resultado das recorrentes operações de “limpeza” realizadas em São Paulo. Tais prontuários deveriam “ser ilustrados com fotos dos pervertidos, para que os juízes [pudessem] avaliar seu grau de periculosidade”.
“Esses retratos, aparentemente banais do ponto de vista fotográfico, hoje recuperados e divulgados, devem ser vistos não mais e apenas como produto da LGBTfobia da ditadura. As imagens ressignificadas são demonstração da capacidade de agência e de resistência, ainda que moleculares, dessas pessoas que aproveitaram a tentativa de controle ditatorial para colocar seus rostos na história.”
Uma conversa com Paula Gaitán por Patrícia Mourão & Maria Chiaretti
Nada na trajetória da cineasta e artista Paula Gaitán segue um fluxo normal de acontecimentos. O nascimento em Paris, filha de um poeta colombiano com uma brasileira imigrante de origem russa-tcheca; o casamento com Glauber Rocha; a carreira artística que, aos 71 anos, atinge uma maturidade e energia produtiva de fazer inveja: tudo isso, e mais um tanto, fez parte da conversa de Paula com as pesquisadoras Patrícia Mourão de Andrade e Maria Chiaretti.
“Com uma obra que inclui documentários experimentais, retratos de artistas, diários memorialísticos, ficções rarefeitas, Paula chega aos 71 anos na sua fase mais radical, fresca e, ao mesmo tempo, mais madura. São raros os cineastas que conseguem conjugar liberdade de experimentação com rigor e precisão. Paula é uma delas.”
Mauricio Lissovsky e os duplos que assombram a história da fotografia por Ronaldo Entler
O colunista Ronaldo Entler resenha o livro A fotografia e seus duplos, publicação póstuma do historiador e pesquisador carioca Mauricio Lissovsky. O livro foi lançado recentemente em versão digital pela editora Acaso, com distribuição gratuita.
“Mas afinal, o que são os duplos? Se não é simples defini-los de maneira sintética, podemos, ao menos, descrever alguns deles: um duplo pode ser uma imagem dentro de outra imagem; podem ser retratos de pessoas – parentes, gêmeos, sósias – que tensionam semelhanças e diferenças; podem ser personagens que, por meio de artifícios diversos, se duplicam dentro de certas fotografias; são também formas que, ao longo da história, se repetem ou se atualizam em lugares distantes e improváveis.”
Inteligência artificial e a construção de museus neurais por Gabriel Menotti
Em ensaio, o pesquisador Gabriel Menotti traça relações entre práticas e aspectos da Inteligência Artificial generativa e o papel de museus etnográficos na história da cultura contemporânea.
“Na sua capacidade de redistribuir objetos como informação em escala, o museu desempenhou um papel fundamental no projeto civilizador da modernidade. Daí podem vir pistas importantes para entender o crescente impacto dos sistemas de inteligência artificial generativa nas economias políticas de representação contemporâneas. Conforme se popularizam, se acoplam a plataformas de comunicação e buscam sutilmente reorientar nossas formas de expressão mais pessoais, os sistemas de IA parecem se consolidar como uma infraestrutura epistêmica ainda mais poderosa e invasiva do que os museus jamais o foram.”
Ana Mendieta: corta-se uma árvore, ficam as raízes por Talita Trizoli
Em cartaz no Sesc Pompeia (SP) no início de 2024, a exposição Ana Mendieta: Silhueta em Fogo apresentou um amplo panorama da obra de Ana Mendieta. Na visão da curadora e pesquisadora Talita Trizoli, o trabalho de Mendieta “é um agrupamento de pulsões primordiais da feminilidade sem mediações esterilizantes. Tomando a metáfora de Yagul, a velha árvore-cidade de Oaxaca, os galhos de Mendieta que mal se expandiam foram violentamente cortados, mas suas raízes se estendem fortemente no imaginário de jovens artistas.”
Celeste Rojas Mugica: implicar-se com as imagens por Daniela Fonseca Moura
Em seu trabalho, a artista chilena Celeste Rojas Mugica investiga as relações entre memória, violência e imaginário. Seja um geoglifo de 2km no deserto de Atacama no formato de um corvo (tipo de facão adotado como emblema histórico das forças armadas chilenas); seja uma visita aos arquivos fotográficos do seu pai (militante e fotógrafo do Movimiento de Izquierda Revolucionaria); ou ainda uma compilação anônima de milhares de imagens de estátuas e monumentos publicadas nas redes sociais durante os protestos de 2019 em Santiago.
Em ensaio, a pesquisadora Daniela Fonseca Moura destaca que Mugica “se apropria da estética do documento, mas desobedece aos procedimentos dos arquivos. Tangencia o tema pela borda, permeada pelos fatos, mas especialmente pelas especulações.”
Na territorialidade da catástrofe por Mariana Lucas
Em ensaio, a historiadora e pesquisadora Mariana Lucas destaca a urgência de se debater as imagens que disputaram a legibilidade da ideia de um “Brasil Grande”, concebida pela ditadura militar nas décadas de 1960 e 1970.
“A história escrita pelos militares transformou a ocupação da Amazônia em uma guerra, em que aquilo que está em jogo é uma disputa entre civilização e natureza. Analisar o regime de visibilidade que emerge nesse contexto é compreender a imagem como um dos mecanismos fundamentais para legitimação do projeto de colonização, que tem na conquista do imaginário um estratégico e poderoso território para o avanço da empreitada política militar.”
Laços de família por Ocean Vuong
Em fotografias e texto, o premiado poeta e romancista vietnamita-americano Ocean Vuong relembra o salão de manicure de sua mãe e as suas primeiras experiências com uma câmera fotográfica. Em dois verões, separados por 15 anos, Vuong retrata momentos familiares e reflete sobre a sinistra plasticidade do tempo.
“A câmera, então, se tornou quase uma ferramenta alucinatória para replicar os vivos enquanto eles percorriam o tempo. Que maneira melhor haveria de dizer a alguém ‘Viva, viva, viva’ que não a de apertar o disparador uma vez após outra, criando a própria prova de alguém?”
Fotografia de resistência e o apartheid sul-africano por Ana Paula Vitorio
Em 10 de maio de 1994, Nelson Mandela realizou seu primeiro discurso como presidente da África do Sul, encerrando o período histórico de controle segregacionista iniciado em 1948. A pesquisadora Ana Paula Vitorio apresenta alguns dos principais nomes da fotografia praticada neste período e que desempenharam papel importante nos processos de luta sul-africanos, cujas circunstâncias criativas lhe impuseram atributos específicos.
“Conhecidas como ‘fotografia de resistência’ ou ‘fotografia de luta’, as práticas fotográficas contra o apartheid – apesar de quando assim chamadas serem comumente atreladas a ações radicais de imersão em áreas e situações de conflito como as do Afrapix – podem ser observadas assumindo diversos e estratégicos contornos ao longo de toda segunda metade do século 20.” ///