Luigi Ghirri por Bob Wolfenson
Publicado em: 13 de fevereiro de 2014Lorenzo Mammì, em seu belo artigo escrito no catálogo/livro da exposição Luigi Ghirri. Pensar por imagens, explicita e traduz de uma forma brilhante todas as aproximações necessárias que a vasta obra do fotógrafo italiano suscita – apesar da curta trajetória de sua vida, interrompida por um infarto fulminante aos 40 anos. Todavia, atendendo a um pedido da ZUM para que eu escrevesse sobre alguma fotografia da mostra, resolvi me aventurar a tecer algum juízo sobre a Módena, de 1973.
Escolhi esta por meu trabalho Belvedere ser herdeiro, ou melhor, tributário desta herança. Por absurda ignorância, não conhecia o trabalho de Ghirri até esta belíssima exposição que o IMS realizou em São Paulo. Entretanto, a linhagem se faz por descendência direta de imagens que se prenunciavam na fotografia americana dos anos 1960, pela figura dos já lendários fotógrafos William Eggleston e Stephen Shore, também admirados por Ghirri. Eles, através de suas obras, inauguraram uma nova ordem baseada nas imagens em cores e na banalidade naturalista e desimportante da cena fotografada. E o fizeram em oposição manifesta à fotografia em preto e branco, predominante à época, cujos conteúdos e formas pareciam exaustivamente estudados por seus autores fotógrafos, e era praticada largamente por grande parte deles que nutriam veleidades artísticas. Não que Ghirri fosse um intuitivo que saía fotografando indiscriminadamente; ao contrário: seu modo era racionalíssimo.
No entanto, para me ater à estrita observação da fotografia por mim escolhida, seus temas, como o desta foto, eram triviais. Em Módena, também está condensada a ideia – como sublinharam Thomas Demand e Christy Lange na conversa publicada no catálogo/livro – de que tudo que se precisa para entender e/ou apreciar uma fotografia de Ghirri está nela mesma. Além do que, como todo grande artista, ele transformava as coisas mais normais em sensações. Seguindo estes pressupostos, Módena me toca sobretudo por carregar algo que em meu Belvedere também afirmo: certa ausência de um sentido grandioso para a existência. Todos os objetos e paisagens aqui contidos estão na sua singeleza anódina, num pacto de não ação entre o observador e o observado. A arrumação modesta, kitsch e despretensiosa me remete às salas de estar de hotéis decadentes das estações de águas em Minas Gerais, cuja similaridade se faz impressionante e me conecta diretamente a esta fotografia. Enquadrada por Ghirri e contextualizada em seu inventário com o subtítulo da série “Desjejum na Relva”, uma alusão ao famoso quadro de Manet, esta antessala varanda é uma fatia pequena no edifício imenso que é a obra de Ghirri e, com a qual em meu primeiro contato já fiquei modificado.///
Bob Wolfenson é fotógrafo brasileiro. Em seus mais de 40 anos de carreira já foi assistente de Chico Albuquerque, Bill King e Luiz Tripoli. Entre seus mais famosos disparos estão Sonia Braga, Maitê Proença e Cleo Pires em ensaios para a Playboy.
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Para mais informações sobre a exposição Luigi Ghirri – pensar por imagens no IMS do Rio de Janeiro clique aqui.