Entrevista: Damarice Amao, curadora de fotografia do Centro Pompidou, e os desafios de recontextualizar os arquivos do museu
Publicado em: 11 de abril de 2024O Museu Nacional de Arte Moderna do Centro Pompidou possui o maior acervo de arte moderna e contemporânea da Europa e o segundo do mundo. Com mais de 45.000 tiragens fotográficas e 60.000 negativos, a coleção de fotografia abrange principalmente o século 20, com foco especial na vanguarda europeia. Atento às questões contemporâneas, o departamento de fotografia tem o desafio de integrar perspectivas descentralizadas nos processos de valorização e enriquecimento do seu acervo. Através do acesso gratuito às suas exposições, a Galeria de Fotografia colabora com a popularização das obras do museu e é considerada um arrojado laboratório de pesquisas da equipe.
Damarice Amao, curadora de fotografia do museu público francês, faz parte de uma geração que pensa a fotografia na sua relação social e cultural, sem se ater exclusivamente ao discurso estilístico e formalista da imagem. Através do resgate de fotografias consideradas invisibilizadas nas coleções, ela vem trabalhando em mostras que propõem recontextualizações dessas imagens à luz de reflexões atuais. Amao conversou com a pesquisadora Marcella Marer acerca dos processos curatoriais das últimas exibições que realizou no Centro Pompidou, sobre a necessidade de fazer parcerias institucionais internacionais para ampliar narrativas na história da fotografia e a importância de se posicionar enquanto uma mulher negra no momento de definir as problemáticas de suas exposições.
Qual foi o seu percurso profissional até entrar no Centro Pompidou?
Damarice Amao: Colaborei como estagiária na exposição La subversion des images (A subversão das imagens) sobre fotografia e surrealismo em 2008. Depois, durante a minha pesquisa de doutorado, fui pesquisadora associada do departamento de fotografia, responsável por fazer o inventário dos negativos de Éli Lotar, que foi também o tema da minha tese. Então, em 2014, entrei no museu como assistente de curadoria e hoje sou curadora no departamento de fotografia. Evoluí na equipe junto com o meu olhar sobre a coleção.
Nas exposições que você realizou a curadoria no Centro Pompidou, nota-se uma busca por exibir artistas e movimentos do período moderno que praticavam uma fotografia social com perspectivas engajadas. O que te interessa nessa produção? Qual é a sua relação com essa temática dentro do museu?
DA: O que me interessa na fotografia é que ela ultrapassa a arte no seu sentido clássico. É difícil desconectar completamente esse meio de expressão da sua relação com a realidade. Esse meio termo me atrai muito. O modernismo e a vanguarda fazem parte de um contexto intelectual e artístico que me instiga, porque a fotografia foi usada de forma muito livre, distante dos códigos tradicionais da arte, em um momento de questionamento geral das sociedades ocidentais sobre sua relação com as imagens. Havia muitas questões em jogo na época que também me ajudam a entender o presente. Nesse período entreguerras, por exemplo, havia uma esperança de que seríamos um mundo de imagens, que só falaríamos através delas. Isso não se concretizou de fato naquela época, mas hoje com os smartphones somos todos potencialmente produtores de imagens e de informações e, finalmente, esse sonho utópico dos anos 30 está se realizando agora.
Faço parte de uma geração de historiadores da fotografia que pensa a fotografia na sua relação social, cultural, que a inscreve em uma história visual. Essa é a minha abordagem, aplicada neste museu artístico. Tenho interesse também pelas “obras”, que constituem a produção visual de uma época e o uso das imagens em outros meios de circulação, como nas revistas. É uma perspectiva diferente daquela de uma geração de historiadores que precisava legitimar a fotografia como arte e encontrar os grandes mestres, para inscrevê-los em discursos mais formalistas baseados em movimentos artísticos tradicionais. Eu estou liberada dessa função, porque finalmente, sim, é uma arte, mas podemos ir além disso, explorando os limites estéticos que a fotografia ultrapassou. Essa é a força dessa mídia.
A galeria de fotografia foi inaugurada no mesmo ano da sua entrada efetiva no departamento de fotografia do museu, em 2014. Existe alguma relação entre a sua abordagem no estudo da imagem e este novo espaço exclusivamente dedicado ao meio?
DA: Sim, certamente. Desde que foi inaugurada por Clément Chéroux, usamos a galeria de fotografia como uma espécie de laboratório para explorar nosso acervo e organizar exposições monográficas, além de exposições temáticas que nos permitem mostrar como estamos progredindo no conhecimento da coleção. Temos essa possibilidade graças, entre outros, ao acervo Bouqueret, adquirido em 2011, que tem 7mil impressões de época da fotografia francesa entreguerras. Além disso, temos na Biblioteca Kandinsky uma bela amostra das revistas ilustradas desse período, de onde nos servimos para as exposições. Então a galeria de fotografia é um espaço para pensar também todos os outros temas e narrativas que podemos escrever a partir dessa coleção. A minha função é de reagir ao acervo, sem limitá-lo a uma leitura apenas formal, propondo outros discursos – como foi o caso de Photographie, arme de classe (Fotografia, arma de classe) e Décadrage colonial (Desenquadre colonial).
Nas suas curadorias você costuma relacionar as obras modernas com questões atuais, não necessariamente com a fotografia contemporânea, mas com movimentos presentes hoje em dia, como foi o caso dos rappers na exposição Décadrage colonial. De que forma você faz esse tipo de relação?
DA: O exercício de incluir numa mesma exposição um diálogo do contemporâneo com o moderno nem sempre é fácil, porque as vezes é uma colagem que pode não funcionar. Em Décadrage colonial eu não quis necessariamente incluir obras contemporâneas. Eu não gosto de fugir do tema, por isso fiz questão de me manter dentro do contexto histórico e geográfico para explorar o assunto com mais profundidade. Mas a meu objetivo é sempre ativar o passado para compreender melhor as questões do presente.
Convidar Casey e Rocé, cantores de rap, para reativar textos dos anos 30, de pensadores anticoloniais franceses ou vindos de territórios ultramarinos (colônias francesas), como Aimé Césaire, Suzanne Césaire, Paulette Nardal, é uma maneira de fazer uma ponte com outro campo da cultura, como a música (era possível ouvi-los cantando em um ponto de escuta dentro da galeria). Os rappers convidados tratam há muito tempo dessas questões, da situação da França pós-colonial em suas canções, mas num campo menos institucional. Os poetas intelectuais como Léon Gontran Damas e Aimé Césaire são fontes poéticas importantes para eles. Reunir num espaço de exposição de museu, o campo do rap com o do intelectual e poético do pensamento decolonial dos anos 30, é colocar em questão essa herança e relembrar a continuidade narrativa atravessando gerações. Mesmo tentando ser rigorosa com relação à estrutura e ao discurso histórico, procuro ser criativa, encontrando soluções curatoriais para que uma exposição e um assunto possam ter uma relevância contemporânea. Meu trabalho no museu é oferecer exposições a um público variado: desde especialistas a novatos, como adolescentes que estão vindo ao museu pela primeira vez. Então, tento ser generosa para que as pessoas se sintam aceitas dentro do museu e das exposições que oferecemos.
Intimamente ligado ao colonialismo, o modernismo europeu e norte-americano influenciou muitos países. De que forma esse aspecto é tratado pelo Museu de Arte Moderna? Nas suas pesquisas, você já buscou relações entre fotografias modernas feitas por franceses em certos países, com as fotografias feitas localmente nesses países?
DA: Do ponto de vista da pesquisa, sempre enfrentamos o desafio de ampliar nosso discurso, descobrir nomes e manter relações de intercâmbio entre países. Recentemente, minha colega Julie Jones foi responsável pela aquisição de algumas imagens do fotógrafo chinês, radicado nos Estados-Unidos, Chao-Chen Yang, que atuou nos anos 20 e 30. Nós estamos muito interessados em redefinir e ampliar esse conceito de modernidade no nosso acervo e nos nossos projetos, da mesma forma que o Centro Pompidou tem tentado fazer com maior ou menor continuidade ao longo de sua história. Gostaríamos de ir ainda mais além na prospecção para a coleção, viajando e estudando melhor determinadas zonas geográficas. Mas também temos que lidar com a realidade institucional enfrentada pela maioria dos órgãos públicos, com restrições orçamentárias, de tempo e de equipe.
Em Photographie, arme de classe, por exemplo, nos questionamos sobre a ambição internacionalista da cena fotográfica militante. Encontramos referências de ligações entre grupos de fotógrafos amadores da classe trabalhadora europeia e grupos similares no Japão. Adoraríamos trocar com investigadores no Japão para estender esta linha de pesquisa, reconstituir essa rede ativista internacionalista e incluí-la de forma mais completa em nossos discursos.
Apesar de terem adotado posturas anticoloniais (como no caso do “Não visite a exposição colonial” de 1931), de aceitarem e acolherem diferenças, você acha que os surrealistas tinham um olhar anticolonial diante das pessoas que eles fotografaram?
DA: Essa é apenas a minha opinião e acho que sim, mas eles também eram produtos de sua época. Quanto às artes extra-ocidentais, da África e da Oceania, pode-se dizer que eles fizeram uma apropriação cultural e que havia uma fetichização em suas maneiras de ver e exaltar o “selvagem”, o “negro”, é verdade. Ao mesmo tempo, eles eram bastante ambivalentes nas suas relações comerciais, incentivando a criação de um mercado para esses objetos não ocidentais.
Portanto, tem uma ambiguidade, mas não podemos esquecer que assumir publicamente uma postura anticolonial naquela época, em 1931, era bastante importante e até corajoso. A poesia surrealista foi também uma fonte de emancipação, especialmente para os primeiros pensadores da negritude como Césaire e Senghor. Esse é um aspecto que merece ser observado, mesmo que eles sejam vistos de forma mais crítica no campo do pensamento pós-colonial.
Justamente sobre esse aspecto ambíguo, na exposição Décadrage colonial, haviam as fotografias de André Steiner de jovens marroquinos nus no porto de Tânger (Enfant se baignant au Maroc), que geraram discussões por poderem ter uma conotação erótica. Qual é a importância de mostrar esse tipo de imagem e como mostrá-la?
DA: Esta série foi objeto de discussões internas até o momento da abertura da exposição. Foi questionado se não haveriam muitos mal-entendidos com o público. A juventude e a nudez são um coquetel explosivo hoje em dia. Para mim ficou marcado que na exposição tinham outras fotos de meninas e mulheres semi-nuas e isso gerou menos interrogações, talvez nenhuma, como se nós tivéssemos o costume de ver mais mulheres objetificadas. As fotos de Steiner são certamente perturbadoras, mas elas nos interrogam também sobre nosso próprio olhar contemporâneo. Os anos 30 são um período de exaltação dos corpos, sobretudo através de uma visão neo-clássica. As fotografias de Steiner são exemplos dessa estética. Queremos mostrar que a leitura e a compreensão dessas imagens mudam dependendo do contexto de suas publicações. Esta plasticidade imagética era muito comum naquela época. É o caso dessa série que foi publicada em revistas artísticas, mas também em uma revista de charme (revista de entretenimento erótico direcionada ao público masculino). Eu decidi mostrar essas imagens, junto com a revista, insistindo neste contexto, e acompanhadas de um texto que destacava essa ambiguidade. Para mim foi importante confiar no espectador e na sua capacidade de exercer sua reflexão. Eu acredito no papel do museu e de uma exposição como espaços propícios à reflexão sobre as imagens, quaisquer que sejam. No final das contas, toda a exposição era problemática e poderia fazer com que nos sentíssemos desconfortáveis com essas imagens, que poderiam ser sedutoras num primeiro instante, e depois questionadoras e perturbadoras. Por fim, eu me pergunto se minha identidade como curadora, mulher, negra, da primeira geração de imigrantes pode ter me autorizado a ir tão longe na apresentação de certos corpos na exposição.
Essas imagens mais questionadoras já haviam sido expostas antes no Centro Pompidou, fazendo parte de distintas abordagens curatoriais?
DA: Essa exposição deve ser compreendida dentro de um contexto de releitura: são imagens que fazem parte da nossa coleção e que não as mostrávamos ou jamais foram mostradas. Especialmente por que elas dificilmente encontram seu lugar num discurso clássico da história da arte, ao lado do Cubismo ou da Bauhaus [escola de arte, arquitetura e design criada em 1919 na Alemanha] mostradas nos demais andares do museu. A ideia era confrontar essa invisibilização mais ou menos voluntária, mas também confrontar as imagens que nos deixam desconfortáveis, como os nus feitos no Marrocos por Steiner ou outras imagens maquiadas de exotismo. Enfim, tratava-se de estabelecer com mais clareza o contexto colonial no qual essas imagens foram produzidas, sendo um pouco confiantes. Eu não sou historiadora colonial, mas meu conhecimento no campo da fotografia dessa época significa que posso contribuir, na minha modesta maneira, para o conhecimento que podemos ter desse período.
Ficou claro que essa exposição marcou a expansão de alguns limites e que se tratava de uma proposta de reflexão conjunta. Houve alguma resistência por parte do público ? Ela foi considerada como militante, por exemplo?
DA: Exatamente: uma reflexão conjunta. Globalmente ficamos satisfeitos, pois não fomos confrontados com situações difíceis. No contexto político e social francês, nós temíamos que a exposição fosse desqualificada ou taxada de wokista (do termo inglês stay woke sobre manter-se atento às questões de justiça social e racial) por pessoas mal intencionadas. Na França, esta é uma forma de desqualificar qualquer tentativa de releitura das relações de dominação, especialmente as coloniais. Nós estávamos na galeria de fotografia, que é gratuita e está no sub-solo, o que também nos permite ter mais liberdade. A exposição funcionou muito bem na sua escala, especialmente pelo boca a boca, e pela cobertura da imprensa especializada (foram 40.443 visitantes / 421 visitas por dia). Vieram muitos jovens graças à gratuidade: basta passar da porta do Centro Pompidou, descer as escadas e ver a exposição tranquilamente. Não houve polêmica, porque talvez estando no sub-solo tivemos menos exposição a olhares que poderiam tentar instrumentalizá-la.
Existem eventuais resistências ou desafios dentro da instituição com relação a temáticas mais sensíveis, por exemplo, ao mostrar as imagens que antes estavam invisibilizadas no acervo?
DA: Falar sobre colonialismo não é um assunto fácil, então requer muito respaldo das equipes internas. A instituição como um todo me deu suporte, apesar de todas as dificuldades que podem surgir ao estar ligada a uma instituição. Trabalhar diariamente nesse tema, com a Lilah Rémy, jovem pesquisadora que fez uma admirável assistência nesse projeto, não foi fácil. Por exemplo, a leitura regular da imprensa daquela época, cheia de estereótipos raciais, quando você própria é negra, mesmo com a distância temporal e a situação bem diferente, isso pode ser bastante difícil no plano íntimo. Um ambiente de trabalho acolhedor foi mais do que crucial. A equipe de Décadrage colonial foi formidável e o fato de a exposição ter sido aprovada internamente foi um gesto importante da instituição, que depositou grande confiança em mim. Foi a primeira vez que organizamos uma exposição a partir da coleção de fotografias com esse caráter, o que não é fácil no contexto atual da França.
Esse lugar de confiança conquistado é um reconhecimento a problemáticas que você sempre pesquisou?
DA: Eu fiz Décadrage Colonial depois de muitos anos no museu, onde também fiz outras coisas. Sou especialista na fotografia moderna na França e sou uma fã absoluta do surrealismo francês antes de tudo. Então sou reconhecida para além do fato de ser “a curadora negra, racializada, que fala apenas sobre esses tipos de questões”. Valorizo essa liberdade e essa não classificação, mas ao mesmo tempo tenho consciência da minha responsabilidade de vir de onde venho e de ser quem eu sou. Senti que precisava realizar essa exposição, apesar de todas as dificuldades que um projeto como esse pode acarretar.
No processo de enriquecimento da coleção existe algum tipo de ressalva na política de aquisição ou de doação quanto à entrada de novas imagens que podem ter um caráter fetichista ou colonial?
DA: Prestamos muita atenção ao que entra na coleção e ao discurso por trás das obras. Hoje em dia, é difícil fazer a aquisição de um “belo” retrato de um homem ou mulher negra sem se perguntar qual é o objetivo do fotógrafo, o que ele quer dizer com a imagem e assim por diante. Não olhamos apenas a qualidade, é importante também refletir sobre o contexto e os usos das imagens.
E no processo de valorização das coleções existentes, de que forma o departamento de fotografia recontextualiza as imagens?
DA: Como nós temos mais de 45 mil fotografias impressas e 60 mil negativos – o que ainda é uma pequena coleção em comparação aos nossos colegas da BnF (Biblioteca Nacional Francesa) – não conseguimos revisar uma a uma. O processo se dá através das exposições, pois são os momentos de foco particular num corpo de trabalho definido e é quando integramos informações mais precisas. Incluímos as datas corretas, conferimos os títulos para ver se são os mesmos dados pelos artistas, fazemos a relação entre as revistas onde as imagens foram publicadas e os negativos (se os tivermos), para ver se as fotografias foram reenquadradas ou não. Relemos todos as biografias e pesquisamos em todos os catálogos de exposições dos artistas. Nós também tentamos fazer esse trabalho no momento da aquisição das obras, como foi o caso das fotografias do sociólogo francês Pierre Bourdieu feitas na Algéria. O acervo era administrado há quase 20 anos pela revista Camera Austria, que realizou um grande trabalho de pesquisa e de contextualização ao longo desses anos e que nós tentaremos trazer à tona o mais rápido possível.
Cotidianamente recebemos pesquisadores com os quais dialogamos. Todo tipo de informação, documentação ou pesquisa científica relacionada a uma parte ou à totalidade de uma coleção, nós aceitamos e integramos na medida do possível, seja na nossa documentação das obras ou alterando algumas vezes diretamente determinados dados de uma obra, após uma verificação dessas fontes por nossas equipes.
Com colegas de outros países ou outras instituições internacionais você discute sobre os assuntos do colonialismo ou sobre Décadrage colonial especificamente?
DA: A exposição foi inaugurada na época da feira Paris Photo (novembro de 2022) e eu tive a oportunidade de conversar com muitos de meus colegas que trabalham no exterior, especialmente os norte-americanos. Conversamos sobre o fato de que certas imagens seriam mais difíceis de serem exibidas no contexto norte-americano. Sou muito adepta da ideia de que fazer exposições responde a um contexto específico.
Tenho grande interesse nas abordagens curatoriais de meus colegas estrangeiros e europeus. Por exemplo, a exposição Kirchner and Nolde. Expressionism. Colonialism, no Stedelijk Museum, em Amsterdã, me ajudou muito na preparação da Décadrage Colonial. Foi uma exposição emocionante que nos permitiu ver grandes obras expressionistas e, ao mesmo tempo, estava muito clara a recontextualização da visão racial de Kirchner e Nolde e de todo o período. Ela nos permitiu compreender o contexto colonial e ver como a atração por culturas não ocidentais foi um álibi para certos artistas modernos, como os expressionistas. Por eu não trabalhar no Museu do Quai Branly, nem no Museu Nacional da Imigração, foi importante ter exemplos de museus de arte que apresentassem obras da primeira metade do século 20, como o Stedelijk, para que eu pudesse me situar melhor com Décadrage Colonial.
Nesse momento, existe algum projeto específico que esteja sendo objeto de revisão?
DA: Sim, uma pesquisadora trabalhou conosco sobre o início da fotografia publicitária na década de 1930. A mesma coleção Bouqueret, representativa da cena fotográfica de Paris nos anos 20 e 30, foi usada como campo de investigação. Com essa coleção, fizemos uma exposição sobre fotógrafas mulheres, depois a Photographie, arme de classe, e recentemente a Décadrage colonial. Esta nova seção sobre a fotografia publicitária é particularmente estimulante. ///
Damarice Amao é historiadora da arte e da fotografia e doutora em história da arte. Curadora no departamento de fotografia do Museu Nacional de Arte Moderna do Centro Pompidou, é especialista no período entreguerras.
Marcella Marer é doutoranda em análise cultural na UZH e mestre em artes e linguagens na EHESS. Atua como pesquisadora e curadora, contribuindo com instituições, editoras e artistas visuais. Colaborou com os festivais FotoRIO, Paraty em Foco, Valongo e ZUM.