Exclusivo: “nósoutros”, o novo trabalho autoral de Bob Wolfenson
Publicado em: 23 de outubro de 2015GALERIA é a seção do site da ZUM dedicada a ensaios e séries fotográficas. Abaixo, em primeira mão, uma prévia de nósoutros, o novo trabalho autoral de Bob Wolfenson.
“A ideia desta série me ocorreu em 2012, num passeio pela praia de Coney Island, nos arredores de Nova York. Ao iniciar o caminho de volta a Manhattan, observei com interesse os desconhecidos que aguardavam para atravessar a rua depois de um dia de lazer intenso sob o sol escaldante do verão nova-iorquino. A postura compartilhada de meros pedestres esperando o sinal abrir os tornava semelhantes, ao mesmo tempo que figurinos e tatuagens, anatomia, cor da pele e atitude (euforia ou introspecção) os distinguia. Fotografei-os com minha Leica de pequeno formato e guardei essas imagens como uma simples curiosidade de viajante. Mais tarde, ao revê-las em meu computador, surgiu a vontade de fotografar e organizar cenas como aquela mundo afora, ressaltando um dos mais marcantes paradoxos do ser humano, tão evidente naquele primeiro instante registrado: o de ser igual e diferente, o desejo de pertencer a um grupo e ao mesmo tempo querer se distinguir dele.
A ambição de criar painéis representativos de identidades humanas diversas porém genéricas me levou a vários países e populações. Um ano depois voltei a Coney Island, devidamente equipado com uma câmera de médio formato que tem como característica principal a excelente qualidade na definição das fotografias, pois a exposição ideal desse trabalho é em grandes ampliações, que permitam ao espectador passear os olhos pelas imagens e ver até o que o fotógrafo não enxerga quando dispara o obturador. Escolhi também fotografar grupos mais singulares, como os judeus ortodoxos de Crown Heights, os afro-americanos do Harlem, ambos em Nova York, bem como executivos engravatados chegando ao trabalho num típico dia de frio do inverno inglês, na City londrina. No mais, a maioria das fotografias foi feita a partir da procura fortuita de lugares onde o afluxo de transeuntes parecesse adequado ao meu intuito.
Ao postar a câmera numa travessia de pedestres e apontá-la para os que esperavam para cruzar, enfrentei uma desconfiança natural. Contudo, como esperava, reconheci manifestações da moda, transformações da vida urbana e a pluralidade étnica das grandes metrópoles – tudo emoldurado pelas cenas registradas e caracterizado pela condição climática de cada local, determinante para a escolha da roupa e para o estado de humor dos passantes.
O processo de realização das fotografias seguiu princípios rígidos: as tomadas foram sempre feitas em cruzamentos ou faixas de segurança, e as pessoas estavam de fato naqueles lugares, mesmo que não tenham sido fotografadas no mesmo momento em que as que aparecem a seu lado na cópia final. Fiz algumas montagens para ressaltar os pressupostos que me levaram a realizar esta ideia. Por mais racional que seja uma empreitada como esta, o imponderável estará sempre presente enquanto houver o instante fotográfico. Nos anos em que me dediquei a este trabalho, pude perceber claramente que quando se está com uma máquina fotográfica no meio da rua, mesmo que com um tripé e com conceitos específicos em mente, não se pode controlar muita coisa. A rua é viva e nos impõe essa vivacidade.” (BW)///
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