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Retrospectiva: os textos em destaque em 2020

Publicado em: 4 de janeiro de 2021

 

Apresentamos uma retrospectiva das matérias mais lidas em 2020. De diferentes visões relacionadas às imagens da pandemia e do isolamento social, a discussões sobre a cultura afro-brasileira, relembre os 12 textos de maior destaque.

 

Olhares, costuras e segredos dos sagrados afro-brasileiros, por Hanayrá Negreiros

Terreiro em Festa – Ilê Axé Tadê Patiti Obá, de Amanda Oliveira, Salvador, 2019. Cortesia da artista.

A pesquisadora Hanayrá Negreiros revela os diferentes olhares sobre as manifestações religiosas afro-brasileiras nos trabalhos de fotógrafos como José Medeiros, na década de 1950, e de nomes contemporâneos como Amanda Oliveira [foto], Juh Almeida e Roger Cipó.

“A exploração da imagem da iniciação de três filhas de santo na Salvador da década de 1950 nos alerta para uma produção de imagem pautada ainda nos moldes do colonialismo. Saltando no tempo, com imagens de jovens fotógrafos negros, vislumbramos a possibilidade de construção de outras narrativas, na qual a história é narrada agora por olhares e memórias ancorados em corpos sobretudo negros”.

 

Cidade de dor , por Teju Cole

© Teju Cole, 2020

Nesta poderosa alegoria do nosso tempo, uma viajante chega a uma estranha cidade num momento de crise. Em novo conto inédito em português, o escritor e fotógrafo Teju Cole descreve uma comunidade assolada por um mal invisível, em que o confinamento e a abstinência dos sentidos foram normalizados e a única esperança de futuro é o exílio.

“Um dia Reggiana não será mais que uma lembrança. Nossa nova cidade será edificada de acordo com o que aprendemos aqui”, diz a viajante da história. “Mas essa futura Reggiana já existe, o futuro no qual isto tudo já é passado. As duas Reggianas vivem juntas, uma dentro da outra, duas almas num só corpo”.

 

A casa dos artistas em tempos de pandemia, por Fabiana Moraes

“Em um planeta em que o 1% mais rico possui o dobro da riqueza acumulada por cerca de 90% da população, a frase ‘estamos juntos, fique em casa’ pode soar como o novo ‘se não têm pão, comam brioches’”. Fabiana Moraes escreve sobre a casa dos artistas em tempos de pandemia.

 

Sorria, você está sendo escaneado, por Giselle Beiguelman

Thiru Seelan e They Are Here, We Help Each Other Grow, 2017. Vídeo feito em colaboração do artista com o coletivo They Are Here. Refugiado em Londres, Seelan faz uma alegoria de sua retenção no Sri Lanka, onde foi interceptado por câmeras térmicas, com uma pessoa dançando no telhado de uma casa na Inglaterra.

A colunista Giselle Beiguelman comenta as questões de ordem política, cultural e estética, relacionadas à naturalização e à opacidade dos sistemas de sensoriamento remoto.

“A paranoia é o horizonte estético pandêmico, e nada mais condizente com isso do que um termômetro em forma de arma. Acompanha esse quadro de ‘novo normal’ a multiplicação das câmeras térmicas e a proliferação dos termômetros de infravermelho na entrada de qualquer lugar”.

 

Bolsonaro e seu reino: retóricas visuais do poder, por Lilia Moritz Schwarcz

31 de maio de 2020. Em plena pandemia da codiv-19, e sem máscara, contrariando o decreto em vigor no Distrito Federal, Bolsonaro passeia a cavalo, acenando a apoiadores em frente ao palácio do Planalto. O próprio presidente compartilhou vídeo do ato em rede social, comentando: “Estarei onde o povo estiver”. (Dida Sampaio/ Estadão conteúdo)

“Imagens nunca são ingênuas”, afirma a historiadora Lilia Schwarcz em dois textos sobre as retóricas visuais do poder: “São fartos os exemplos que comprovam como o atual governo brasileiro, em especial o presidente Bolsonaro, vem reproduzindo cenas históricas das extremas direitas – seja do nazismo alemão, do fascismo italiano ou do suprematismo branco norte-americano. Essa estética se encontra por toda parte: nos cumprimentos militares, nos gestos, nos adereços, nos detalhes, grandes e pequenos”. E no texto O dirigente, a criança e o futuro, Lilia comenta que desde os tempos do Império e da República até os dias atuais de Trump e Bolsonaro, “não há governo que deixe de projetar o seu porvir a partir do uso da imagem de uma ou várias crianças”.

 

Sobre o isolamento e a pornografia, por Maria Rita Kehl & Caroline Valansi

Fotocolagem do ensaio Zona franca, de Caroline Valansi, 2020

A psicanalista Maria Rita Kehl explorou o universo do pornô online pela primeira vez para escrever sobre sexo e pornografia durante o isolamento.

“Imagens sexuais, de maior ou menor intensidade, circulam por toda parte. Isso não torna, necessariamente, o sexo banal. Quero dizer que ele, o onipresente sexo, de tanto ser associado a marcas de produtos, de tanto ser usado para alavancar o interesse de filmes medíocres, perdeu seu poder de falar direto a nossas mais desconhecidas representações inconscientes”. A artista Caroline Valansi produziu o ensaio Zona franca especialmente para a matéria.

 

Meu vício é gente: a fotografia de Vania Toledo, por Erika Palomino

As Frenéticas

“Meu vício é gente. Gente atuante, libertária, gente que produz e faz arte, que gosta de viver como eu. Por isso ou por aquilo, sempre fotografei pessoas assim, com esse perfil”. Foi assim que Vania Toledo abraçou a sua profissão, retratando de maneira especial personalidades que marcaram a cultura brasileira nos anos 1970, 80 e 90.

“Com muito charme e uma Yashica na mão, abriu portas e oportunidades para traçar uma trajetória única e original, em que vida e obra se atravessam”, escreve a jornalista Erika Palomino em texto que relembra a trajetória e homenageia a fotógrafa falecida em julho.

 

A imagem da pandemia – 1918-2020, por Ana Maria Mauad

Quais são as imagens da pandemia? A partir de um paralelo entre a cobertura noticiosa da covid-19 e da gripe espanhola de 1918, a pesquisadora Ana Maria Mauad fez um panorama dos universos visuais que se configuram em torno dos dois eventos pandêmicos.

“Apesar da economia visual bastante diversa dos dois períodos, a elaboração da covid-19 e da influenza de 1918 em fotografias na imprensa guarda semelhanças evidentes”, escreve a pesquisadora. “Nos dois momentos, as imagens que ficam são as dos mortos em massa, das covas rasas e da vulnerabilidade de um número ainda maior de pessoas”.

 

Algoritmos, arte e internet: os desafios dos museus na pandemia e depois, por Pollyana Quintella

Captura de tela da palestra-performance Super amuleto: tarde de dia de cão, de Wisrah Villefort, Desktop Aberto Pivô, 2020

A curadora e pesquisadora Pollyana Quintella pontua os principais desafios para a reabertura de museus e instituições culturais após a pandemia da covid-19: “seguimos reforçando o cânone do espaço expositivo tradicional como único meio possível, e poucas vezes observamos as instituições abrirem espaço para situações mais experimentais. Com isso, parecemos ignorar as infinitas variações que a internet comporta, bem como as diferenças entre obras físicas migradas para a web e obras que já nascem com DNA digital”.

 

Vinte anotações sobre Farroupilha, de André Penteado, por Paulo Scott

Sem título (parte da série Cerro dos Porongos / Dia)

O escritor Paulo Scott comenta Farroupilha, do fotógrafo André Penteado. Ao lado de Cabanagem (2015) e Missão francesa (2017), este livro é a terceira parte do projeto Rastros, traços e vestígios, em que Penteado realiza uma investigação visual de fatos nacionais que ocorreram antes da invenção da fotografia ou que não possuam uma iconografia fotográfica de época.

Na visão de Scott, a “simbologia em torno da chamada Revolução Farroupilha é, nos dias de hoje, talvez como ainda não havia ocorrido nas últimas décadas, destino de acirrada disputa. Imagens que capturem cenários, arquiteturas, expressões em geral passíveis de serem conectadas ao histórico daquele período podem ter múltiplas interpretações – nessa dinâmica surgem certezas, mas também se revelam novas e significativas incertezas”.

 

Arlindo Machado: vida e obra no prisma da admiração, por Lucia Santaella

OP_ERA: A Journey, de Daniela Kutschat e Rejane Cantoni, realizada no CAVE, Laboratório de Sistemas Integráveis (LSI-USP), 2003. Foto de João Caldas. Acervo das autoras.

“Tenho à minha frente, pousada na minha mesa de trabalho, a pilha de livros de Arlindo Machado que fui colecionando em minha biblioteca. Todos lidos e relidos, todos contendo dedicatórias afetivas que sempre me comoveram e hoje trazem à tona ondas de memórias povoadas de imagens, de compartilhamentos, de risos e de falas dos momentos vividos em comum, agora transfigurados em nuvens intangíveis de saudades”.

A professora Lucia Santaella escreve sobre a vida, a obra e a sua admiração pelo amigo Arlindo Machado, um dos mais importantes pensadores brasileiros sobre a teoria da imagem e falecido em setembro.

 

As reencarnações de uma mulher negra: pessoa-coisa-pessoa, por Alexandre Araujo Bispo

O crítico Alexandre Bispo analisa processos artísticos e históricos que levaram a fotografia Mulher de turbante, feita por Alberto Henschel no final do século 19, a hoje evocar diferentes nomes de mulheres negras de nosso passado escravagista.

“Para além dessa produtividade visual que multiplica e difunde a imagem matriz, as apropriações que encarnam ao retrato os nomes de Luísa Mahim, Maria Felipa e Dandara dos Palmares vieram para permanecer e, mesmo que arbitrárias, seguirão o fluxo do desejo de rosto para aquelas cujos nomes mais ou menos fictícios chegaram até o presente”. ///

 

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