SÃO PAULO, FORA DE ALCANCE – Mauro Restiffe

 

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A primeira exposição do novo programa de exposições de fotografia contemporânea do IMS é São Paulo, fora de alcance, do paulista Mauro Restiffe. A pedido da revista ZUM, Restiffe já havia fotografado o bairro da Luz em 2012. Para esta exposição, ele foi convidado a estender seu trabalho sobre a cidade de São Paulo, realizando caminhadas por outros bairros, tanto centrais quanto periféricos, como Brás, República, Pinheiros, Vila Congonhas e Itaquera. Esses deslocamentos aconteceram quase diariamente por três meses e deram origem a centenas de fotografias, feitas com a câmera Leica e o filme preto e branco de alta sensibilidade que fazem parte da poética do artista. Restiffe é conhecido pelas séries fotográficas que desenvolve em torno de questões urbanas de relevância histórica, política e arquitetônica.

As 18 obras escolhidas para a exposição apresentam a cidade, o espaço urbano e seus habitantes. Muito longe de cartões-postais, elas atualizam o repertório visual de São Paulo ao olhar para espaços públicos e construções importantes como o estádio Itaquerão, a praça do Relógio, o Templo de Salomão, a praça Roosevelt, o vão livre do Masp e o Museu do Ipiranga. Ampliadas em formatos que variam de 60 centímetros a mais de dois metros de largura, as imagens ganham escala monumental.

Os usos variados que os habitantes fazem da cidade e os diversos estágios de construção e conservação do patrimônio arquitetônico se combinam para narrar visualmente a experiência fragmentada que caracteriza a vida urbana. Nas imagens da exposição, os deslocamentos diários ao trabalho ou os passeios de fim de semana se misturam a fatos extraordinários, como o incêndio no Memorial da América Latina, ocorrido em novembro de 2013, ou um dos vários protestos realizados no ano passado.

Ao usar o preto e branco para fotografar acontecimentos recentes, o fotógrafo dá às obras uma ambiguidade temporal. O preto e branco e a alta granulação produzem uma unidade entre as pessoas e o variado tecido urbano, ao mesmo tempo em que serve de metáfora para a organização caótica e precária das cidades.

As obras de Restiffe serão afixadas em painéis espalhados pelo espaço expositivo em vez de estarem penduradas nas paredes. A montagem, que faz alusão ao percurso das cidades, obriga o visitante a confrontar-se com as obras e contorná-las, construindo planos, perspectivas e bloqueios conforme se caminha pela galeria. O título da exposição também sugere a impossibilidade de representar uma cidade grande e complexa como São Paulo.

São Paulo, fora de alcance tem curadoria de Thyago Nogueira, coordenador de fotografia contemporânea do IMS. O projeto expográfico é de Martin Corullon, do escritório Metro Associados, e a identidade visual, de Daniel Trench. A exposição é acompanhada de um livro com cerca de 50 imagens do projeto.

O novo projeto de exposições em fotografia contemporânea se soma às atividades que o IMS vem desenvolvendo nesta seara nos últimos anos e que incluem a publicação da revista de fotografia ZUM e o oferecimento da Bolsa de Fotografia ZUM/IMS.

Sobre o artista

Mauro Restiffe nasceu em São José do Rio Pardo, em 1970. Formou-se em cinema pela Faap e estudou fotografia no International Center of Photography e na New York University. Suas obras foram expostas, entre outros lugares, no MAC-SP (2011) e na 27ª Bienal de São Paulo. Seu trabalho faz parte de coleções importantes, como as da Tate Modern, do MoMA de São Francisco, de Inhotim e da Pinacoteca do Estado de São Paulo. Foi indicado ao prêmio BES-Photo de 2011 e, em 2013, foi premiado pela Fundação Conrado Wessel. Expôs no Rio de Janeiro em 2006, na galeria Laura Marsiaj. Esta é sua primeira individual institucional na cidade.

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Texto do Curador

Cidades são organismos vivos – nascem, crescem e se desenvolvem. Raramente morrem e, em geral, sobrevivem àqueles que as moldaram ou que nelas vivem. A convite do Instituto Moreira Salles, o fotógrafo Mauro Restiffe percorreu bairros centrais e periféricos de São Paulo, como Luz, República, Pinheiros, Vila Congonhas e Itaquera. Munido de uma câmera portátil e de filmes em preto e branco de alta sensibilidade, Restiffe palmilhou as ruas para esquadrinhar a vida da cidade num momento de profundas transformações. O resultado está nas fotografias desta exposição — uma síntese visual da paisagem humana, arquitetônica e topográfica de São Paulo e uma representação aguçada das tensões políticas e sociais que dão forma ao espaço urbano.

Os usos variados que os habitantes fazem da cidade, os conflitos entre o desenvolvimento econômico e o patrimônio arquitetônico, a complexidade de planos e situações que decorrem do relevo urbano – tudo isso faz parte das imagens. Eventos cotidianos, como os deslocamentos diários ou os passeios de fim de semana, convivem com fatos extraordinários, como um dos vários protestos do último ano ou o incêndio no Memorial da América Latina. Cartões-postais como o Museu de Arte de São Paulo dividem a atenção com lugares menos reconhecíveis, como a praça do Pôr do Sol ou os arredores da avenida Jornalista Roberto Marinho. Estamos olhando para o espaço e o tempo da cidade, aquilo que lhe dá corpo e vida.

Parte da frustração e do fascínio que São Paulo exerce sobre seus habitantes vem de seu ciclo de evolução acelerado e da dificuldade em controlar inteiramente o espaço urbano. É o que sugere a fotografia tirada no largo da Batata, ao mostrar um importante entroncamento da cidade ao mesmo tempo em reforma e em ruína. Tão logo surgem, as construções de São Paulo já parecem velhas, como se precisassem ser constantemente substituídas, numa espiral de renovação que não vê fim.

As fotografias de Restiffe apresentam uma complexidade de situações urbanas, algumas claramente visíveis, outras menos. Mesmo que os planejadores de uma cidade fossem indiferentes ao espaço, acreditava o antropólogo Claude Lévi-Strauss, as cidades seriam o produto de uma estrutura mental subjacente, uma ordem quase fora de alcance, que se insinuaria sobre os domínios vagos para se expressar de forma simbólica ou real, “um pouco como as preocupações inconscientes se aproveitam do sono para se exprimir”.

Depois de percorrer e fotografar exaustivamente São Paulo, Restiffe talvez tenha intuído uma ordem própria. Ao expor a complexa interação entre o espaço, as pessoas e a arquitetura, ao sugerir que a experiência urbana é uma realidade fragmentada, definida por microscópicos grãos de prata, o fotógrafo age como um planejador inconsciente, um artista que, talvez sem perceber, constrói uma nova forma visual para representar a cidade.

Thyago Nogueira, curador e coordenador da área de Fotografia Contemporânea do Instituto Moreira Salles.

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