Revista ZUM 1

O léxico industrial de Bernd e Hilla Becher

Ulf Erdmann Ziegler Publicado em: 14 de outubro de 2015

Faleceu neste sábado, 10 de outubro de 2015, Hilla Becher, esposa de Bernd Becher, por sua vez morto em 2007, casal que influenciou boa parte da fotografia contemporânea. Leia abaixo na íntegra a entrevista publicada na revista ZUM #1, de outubro/2011. Em rara conversa, ocorrida alguns anos antes da morte dele, os Becher falam do projeto que os ocupou por cinco décadas: fotografar e classificar as estruturas industriais que seguem desaparecendo da paisagem moderna.

03

As elegantes fotografias em preto e branco de Bernd e Hilla Becher registram quase exclusivamente construções industriais anônimas, erigidas por engenheiros, e não oriundas da prancheta de um arquiteto. Reunindo em conjuntos fotografias que exibem estruturas semelhantes, os Becher mostraram, por um lado, que tais estruturas formam categorias, chamadas de tipologias, e, por outro, a gama de variações que ocorre em cada tipologia. Fotografadas nos meses de inverno e sob céus cinzentos, as edificações revelam sua essência física.

O alemão Bernhard Becher (1931-2007) nasceu em Siegen, cidade onde a mineração do carvão e a agricultura eram o meio de vida primordial. Hilla Wobeser nasceu em 1934, em Potsdam, perto de Berlim, numa cidade dominada pelo palácio rococó de Sanssouci. Embora tenham nascido no tempo do nacional-socialismo, Hilla testemunhou também os primórdios da República Democrática Alemã, de início como estudante, depois como aprendiz de um fotógrafo da cidade. Em 1954, após fugir para a Alemanha Ocidental, ela conheceu Bernd Becher, estudante de arte em Düsseldorf, na época o centro da publicidade e das finanças, da administração e das artes. Casaram-se em 1961, o ano da construção do muro de Berlim. Na Academia de Artes de Düsseldorf, começaram a produzir e sistematizar suas fotografias de edificações industriais – o vale do Ruhr, então o centro industrial mais importante da Alemanha, estava a poucos quilômetros dali.

Bernd Becher estudou pintura e desenho em Stuttgart, entre 1953 e 1956 – época em que se voltou para a fotografia, com o intuito de registrar instalações industriais próximas a sua cidade natal, que desapareciam em ritmo acelerado. Em 1957, quando o casal começou a trabalhar junto, já estava claro que não assumiriam o papel de fotógrafos industriais clássicos. O primeiro projeto conjunto, que durou quase duas décadas, foi a documentação dos edifícios com estrutura de madeira da região industrial de Siegen. O principal projeto da dupla na década de 1960 tratou, porém, da indústria pesada, cujas instalações estavam sendo fechadas e demolidas. Numa corrida contra o tempo, puseram-se a fotografar na Inglaterra, na Alemanha, na Bélgica e na Holanda.

O público alemão demorou a acolher a arte fria e documental dos Becher, mas, por volta da década de 1980, as tipologias dos Becher passaram a ser presença obrigatória nos museus. Em 1976, Bernd Becher tornou-se professor de fotografia da Academia de Artes de Düsseldorf, disciplina que não costumava constar do currículo das academias de artes plásticas. Muitos de seus alunos alcançaram enorme sucesso:

Candida Höfer, Thomas Struth, Jörg Sasse e Andreas Gursky, entre eles. Quando Becher se aposentou, em 1996, Jeff Wall foi escolhido para sucedê-lo, mas, no primeiro contato com a classe, defrontou-se com um ex-aluno de Becher portando uma arma. Wall renunciou ao posto de imediato. Bernd Becher ficou furioso com a passividade da academia. A cadeira foi entregue a Thomas Ruff, outro discípulo conhecido, ainda que, em certa medida, um dissidente.

Entrevistei os Becher pela primeira vez enquanto a exposição Minas de carvão (1999) acontecia em Colônia. Eles revelaram-se um casal simpático, embora exibissem traços de obstinação e certa tendência a interromper um ao outro. Responderam às perguntas com precisão; Bernd com preferência por mostrar as coisas, em vez de explicá-las. Voltei para gravar esta entrevista em 14 de junho e 17 de setembro de 2000. Ao final de cada visita, insistiram para que eu os acompanhasse a um dos restaurantes ou bares de Kaiserswerth, outrora uma orgulhosa cidadezinha que hoje é parte de Düsseldorf.

02

 

ULF ERDMANN ZIEGLER: Começando pelo começo, como foi que se conhece­ram e chegaram à fotografia?

BERND: Nós nos conhecemos numa agência de publicidade, a Trost. Foi em 1957, eu tinha 26 anos.

E já havia concluído os estudos na Academia de Artes de Düsseldorf?

BERND: Não, tinha mudado nesse mesmo ano de Stuttgart para Düsseldorf e, para financiar os estu­dos, trabalhava na agência.

A senhora também?

HILLA: Eu tinha um emprego na agência. Estava muito feliz lá, mas depois vi que não era publi­cidade o que eu queria fazer. Então pensei que o melhor seria voltar aos estudos.

Foi o que fez?

HILLA: Foi, eu me candidatei para uma vaga na academia. Fui aceita, embora fosse complicado, porque não tinha fotografia, e eu não sabia pintar.

Então foi aceita para fazer o quê?

HILLA: Em última instância, fotografia mesmo. A academia não tinha um departamento de foto­grafia, mas havia interesse de alguns professores e dinheiro para comprar equipamentos. Foi disso que me incumbiram, como estudante.

E o que comprou?

HILLA: Uma máquina fotográfica…

De negativo de grande formato?

HILLA: É, e acessórios também.

BERND: Um ampliador Durst, de 13 × 18 cm.

HILLA: Bem profissional, um 13 × 18 cm, tanques, bandejas, todo o necessário. Isso dava aos alunos que tivessem interesse no assunto a possibilidade de trabalhar ali, e a nós também. As condições eram difíceis naquele tempo, o aluguel de espaços grandes era caríssimo; comprar equipamento pró­prio, impossível. Ali estava a oportunidade.

Agora eram colegas de academia.

HILLA: Éramos estudantes.

E isso foi até quando?

BERND: Até 1961.

Nesse ano, então, já tinham concluído os estudos?

HILLA: Concluído propriamente não. Parávamos quando acreditávamos que já tínhamos estudado o suficiente.

Então não havia uma conclusão oficial?

BERND: No fundo, tínhamos terminado fazia tem­po, mas ficamos na academia por causa do labora­tório. Simplificando, foi isso.

A senhora tem formação como fotógrafa. Onde foi que se formou e o que era considerado, então, boa fotografia?

HILLA: Primeiro, eu me dediquei à fotografia por conta própria, quando tinha 12, 13 anos. Os meios de que dispunha eram bastante precários. Isso foi logo depois da guerra, e o material fotográfico que tínhamos era de antes da guerra, parte dele já embolorado. Mas, de um jeito ou de outro, conse­guíamos as coisas no mercado negro. Minha mãe, quando jovem, tinha aprendido a fotografar – era fotógrafa, mas nunca mais havia exercido a pro­fissão. Ela me deu uma máquina fotográfica e me deixava brincar um pouco. Tudo isso aconteceu em Potsdam, ou seja, ainda na Alemanha Oriental. Mais tarde, fui atrás de um aprendizado de fato.

E com quem aprendeu?

HILLA: Com um senhor mais velho chamado Wal­ter Eichgrün, que tinha sido fotógrafo da corte prussiana em Potsdam, como o pai e o avô. Eles tinham um arquivo imenso, com chapas enormes relacionadas à vida da corte. Acontecimentos polí­ticos fotografados como se fazia no século 19, com equipamentos da época, inclusive as lentes. Há tempos não havia mais nada daquilo, por causa da guerra. O estúdio era como se fosse do tempo do império, com mobília preta de ébano e corti­nas pesadas – “a cripta” foi o apelido que demos a ele. Era um aprendizado muito bom. Porque meu professor fotografava corretamente e conhe­cia bem composição, luz, sombras e perspectiva.

Além disso, estava disposto a ensinar. O estúdio ocupava todo um andar de um edifício em Pots­dam. Fazia o que lhe encomendassem: retratos, fotografia de objetos, reproduções e muita arqui­tetura também. Isso ele fazia bem, por isso era sempre chamado. Naquela época, estava encarre­gado de fotografar Sanssouci por fora e por den­tro: o parque, os castelos, os cômodos, as estátuas. E eu sempre ia junto, carregando as coisas todas. Isso foi de 1951 a 1953, mais ou menos. Larguei o secundário antes do tempo. Porque nem sempre conseguíamos manter a boca fechada. Preferi sair por livre e espontânea vontade a ser expulsa. Não tinha nem 17 anos. Quando fugimos, eu tinha 19. Aí o aprendizado já tinha acabado.

O que o fotógrafo do palácio de Sanssouci conside­rava boa fotografia?

HILLA: A mesma coisa que hoje consideramos a boa fotografia do século 19: uma fotografia clara, limpa, com todas as gradações de cinza, profundi­dades harmônicas, comprometida com o objeto.

Mas a senhora está descrevendo a fotografia do século 20. No século 19, havia uma predileção por linhas suaves, vedute [pintura, desenho ou gravura que apresenta a vista de uma cidade]…

HILLA: Existiam duas correntes na fotografia do século 19, e essa era a da fotografia direta. Os retratos não eram muito diferentes dos de August Sander. Sander é, para mim, um fotógrafo do sécu­lo 19, que se orienta pela pintura. Essas pessoas sabiam muitíssimo bem como mostrar uma mão, como inserir essa mão no quadro, girando um pou­co os ombros, fazendo a luz incidir pelo lado mais distante do rosto, os cabelos iluminados por trás.

Bernd, podemos dizer que, quando se conheceram, o senhor já havia fotografado edifícios industriais?

BERND: Já. As primeiras fotos são de 1957, quando ainda não nos conhecíamos. Foram tiradas com uma máquina de pequeno formato, e não como fotografias propriamente, mas como base para desenhos e pinturas. Havia uma instalação indus­trial em demolição. Passei semanas sentado ali, desenhando, mas não conseguia acompanhar o ritmo da demolição. Fotografei a instalação para completar os desenhos, depois para fazer águas­-fortes, litografias, pinturas. Mas eu também já tinha começado a colecionar fotos sempre que podia, fotos de instalações industriais feitas pelos proprietários. Fotos da siderúrgica de Prachbach, da siderúrgica de Niederscheld, onde meu avô tinha trabalhado, da siderúrgica de Grünebach e assim por diante. E, em Siegen, da siderúrgica de Hain. Conseguia as fotos quando conhecia gen­te que trabalhava nas indústrias. Quando as ins­talações eram modificadas – modernizadas – ou fechadas, quando os escritórios eram desman­chados, ninguém mais queria as fotos. Queriam se livrar da imagem do século 19. Eu gostava daquelas fotos enormes, feitas por contato, que representavam as instalações com tanta precisão. Antigamente, essas indústrias não eram grandes. Quando elas tinham um alto-forno, ou dois altos­-fornos, podia-se enquadrar tudo sem necessidade de cortar nada. Era como, digamos, retratar duas garrafas. Indústrias gigantescas, como as que vie­ram mais tarde – Krupp etc. –, não existiam por ali. A fotografia industrial tendia a empregar um for­mato horizontal e muitas vezes incluía um grupo de pessoas, posicionado de modo que a instalação ficasse visível ao fundo. Também encontramos isso na representação das ferrovias, da navegação a vapor. Tem muito disso no século passado, inclu­sive em gravuras.

E quanto à senhora, que havia fugido de um Estado que glorificava os trabalhadores e conheceu esse tal de Bernhard Becher, com seu estranho interesse em instalações industriais? Vinda de Sanssouci, da foto­grafia do século 19, não achou esse interesse peculiar?

HILLA: Aquilo me atraía também, eu só não sabia direito de que maneira. Da primeira vez que estive na região do Ruhr, fiquei admirada. Antes dis­so, já me interessara por locomotivas. Depois que fugimos de Berlim, eu circulava muito pela região portuária de Hamburgo. Ainda não tinha ideia de como representar aquilo: só ficava por ali, tirando fotos com a Rolleiflex. Tentava capturar aquela ter­ra de ninguém, onde não havia nada, só que, sem um objeto, não funcionava. De alguma maneira, sempre acabamos recorrendo a um objeto, um guindaste, por exemplo. Mas a coisa toda ainda não tinha uma forma, e eu talvez tenha sofrido influência de Albert Renger-Patzsch. Havia ainda muito pouco material que eu pudesse imitar.

A partir de quando sua fotografia adquire forma pró­pria? Ter encontrado essa forma já foi uma decor­rência da cooperação entre os dois?

HILLA: A cooperação surgiu do interesse comum.

Isso significava enredar-se concretamente na histó­ria da indústria, na história daquelas construções?

BERND: Naquela época, ainda não se podia falar nesses termos. Tive uma trajetória um pouco diferente. Minha intenção inicial era fotografar objetos com precisão para, depois, recortá-los e reuni-los em montagens ou colagens. Para evitar sobreposições, eu me posicionava no alto, fotogra­fava de cima de uma escada. Recortava a parede de uma edificação para depois ter 20 paredes, que jun­tava numa colagem. Foi quando notei que, fotogra­fado do alto, o objeto se integra ao fundo. Do alto, o fundo se desdobra. Isso talvez não tenha sido uma descoberta, mas algo que decorreu da nossa experiência conjunta. Vimos que, postas uma ao lado da outra, as coisas adquirem uma correspon­dência. Quando dispostas em grupo, coisas que mal se distinguem umas das outras ganham indi­vidualidade. As casas dos operários, por exemplo, ou as torres de extração, se parecem muito, mas só quando se está passeando por elas.

HILLA: Têm um padrão comum.

BERND: Eram muito parecidas, como se saídas de uma linha de produção, como é o caso dos auto­móveis. Apenas quando postas lado a lado é que se vê a individualidade. O que aconteceu foi que essas instalações foram demolidas. Sobretudo em Sieger­land, percebi que, a partir de 1950, mais ou menos, as siderúrgicas estavam fechando; depois, foi a vez das minas, uma atrás da outra. Senti a necessida­de – não diria a obrigação – de documentar essas coisas também.

O senhor nasceu em Siegen. Cresceu também em meio a essa paisagem industrial?

BERND: Sim. Em Siegen, praticamente no centro da cidade, tínhamos um pequeno alto-forno. É coi­sa que, hoje, nem dá para imaginar, toda aquela sujeira se espalhando pelo centro velho. Da nossa janela, eu podia ver, ouvir e sentir o cheiro da side­rúrgica. Assim como as igrejas de São Martinho ou São Nicolau, lá estava a siderúrgica de Hain. Era um distrito dentro da cidade.

Quando começou a fotografar a sério em Siegerland, como chamava o que estava fazendo? O senhor cha­mava de documentação, acreditava estar escrevendo um pedaço da história da indústria alemã? Ou via aquilo como arte?

BERND: Na época, eu pensava que o que Jean Tin­guely fazia era uma interpretação da indústria do ponto de vista das artes e ofícios. E não achava bom aquilo. Hoje minha visão é outra. Vejo pelo menos que era uma coleção maravilhosa de ferro­-velho, de coisas que não existem mais. Passei a achar as primeiras obras muito boas. Mas pensava que um alto-forno ou uma mina eram muito mais interessantes. Até porque são objetos monumen­tais, mais ricos em detalhes. Têm um caráter irra­cional – porque não dá para entendê-los – e, não obstante, são estáticos e funcionais. Contam com precisão a história de seu tempo, da época anterior à Primeira Guerra Mundial, o boom do aço. Mos­tram que se produzia muito mais que o necessário.

Um objeto histórico que fala sobre si mesmo?

BERND: Um barroco calvinista. Por trás dessas estruturas, está o desejo sensato de ganhar dinhei­ro. Por outro lado, produzem-se coisas de que nem precisamos. É isso que mostram.

O que acreditava então que aconteceria nas décadas seguintes?

BERND: Achávamos que iríamos viver uma aventu­ra maravilhosa, que viajaríamos pelo mundo todo. Já havíamos estado na Bélgica, assim como nas minas de Aachen e em Saarland. Tínhamos viaja­do para o norte da França, só para olhar. Pensa­mos: se o nosso trabalho resultar de fato em uma

sistematização, vamos ter na gaveta uma espécie de região industrial internacional. Como as insta­lações estavam desaparecendo, imaginamos que sua conservação por meio de fotografias conquis­taria, em algum momento, interesse mais genera­lizado. Não era possível que não acontecesse. Afi­nal, somos indústria! Todos nós andamos de carro! Aquela ideia romântica de que podíamos prescin­dir da indústria, de que poderíamos viver sem ela, nunca compartilhamos. Por outro lado, tampou­co tínhamos uma visão positivista. Já enxergáva­mos o que havia de estranho, a superprodução… e todas as dificuldades daí decorrentes. Mas vimos também que as pessoas diretamente envolvidas com a indústria – aqui no Ruhr, em Lüttich, em Charleroi – compunham uma espécie muito par­ticular, que via aquilo tudo como parte de sua própria vida. Eu conhecia aquele mundo desde Siegerland: todos os meus antepassados, por par­te de pai e mãe, tinham trabalhado nas minas ou na siderurgia. Eu conhecia aquela situação, o vocabulário. Para mim, era um prolongamento da infância: procurar lugares que se parecessem com aqueles onde eu havia crescido.

A partir de quando começaram a expor as fotografias?

BERND: A primeira exposição foi em 1963, na Gale­ria Ruth Nohl, em Siegen.

HILLA: Que era uma livraria.

BERND: Uma galeria progressista também. Naque­la época, já promoviam exposições dedicadas a Karl Otto Götz, Brüning, Gaul, Reinhold Köhler – um bocado de gente do informalismo.

Ou seja, desde a primeira exposição, já se encaixa­ram no contexto das artes plásticas.

BERND: Não havia outra possibilidade. Mesmo museus e institutos que promoviam exposições de fotografias não teriam exposto as nossas.

Por que não?

HILLA: Porque não era arte!

BERND: Diziam que fotografávamos paredes! Que aquilo não era nem uma interpretação do mun­do nem uma visão artística da indústria. Quando se contemplam, por exemplo, as fotos de Otto Steinert, o modo como ele fotografava a indústria, aquilo era uma transposição altamente dramática, influenciada pela arte abstrata, pelo surrealismo. Mas dizer: essa torre de extração é um objeto igual­mente interessante – isso não era possível. Gente como Reinhold Köhler, em Siegen, ou como Nohl, percebeu isso. Naquela época, nunca tinha havi­do uma exposição de nossas obras em Düsseldorf, embora morássemos lá.

O primeiro livro foi Esculturas anônimas, não foi?

BERND: Sim, bem mais tarde, em 1970. O primeiro catálogo veio antes, na primavera de 1967.

Teve um momento em que concluíram que o livro seria, talvez, o melhor veículo?

BERND: Essa é uma ideia que só se poderia ter hoje em dia, quando se dispõe de uma técnica de impres­são tão boa. Diante de uma foto original, no entan­to, pode-se até passear pela imagem. A precisão e as gradações de cinza são muito particulares. Além disso, tem-se a possibilidade de juntar imagens: daí surgiu a primeira tipologia. A pessoa pode se afas­tar três, quatro metros da imagem e ver o todo, ou pode chegar bem perto e ver cada parafuso. O livro é outra coisa. O tema é exposto de forma limitada: a pessoa folheia e, então, põe de lado.

Como chegaram à ideia da tipologia?

BERND: Na Nohl, usamos molduras quadradas, nas quais se podia optar tanto pelo formato vertical como pelo horizontal. As molduras dispunham-se em duas fileiras, uma debaixo da outra, pendura­das na frente das estantes de livros.

Imagino que tenham deparado com uma dificuldade de sistematização, porque, se queriam completar a tipologia – para ter, digamos, 100 torres de extração –, tinham também, em cada lugar onde havia uma tor­re de extração, de documentar todo o resto. Aí o tra­balho avançaria muito lentamente. Os senhores se viram alguma vez diante do dilema de fotografar ape­nas as torres de extração ou a instalação inteira?

BERND: Sempre que possível, fotografamos a ins­talação inteira.

HILLA: A pressão existia por causa da primeira cri­se do carvão e, depois, da primeira crise do aço. Sabíamos muito bem…

BERND: …se não fotografarmos tudo agora, vai nos fazer falta depois. Mesmo que não achemos lá muito bom. Se era, por exemplo, uma edifica­ção sem aura particular. Aí era chato. Mas fotogra­fávamos assim mesmo. Às vezes, tínhamos uma surpresa, sobretudo nas fotos tiradas com grande­-angular. Quando se tem de fotografar de perto, é preciso usar a grande-angular, e só na imagem é possível ver o todo. Só se pode avaliar um objeto como um todo quando se tem a distância devida. A experiência mostrou que as fotos com grande­-angular deviam ser tiradas a meia altura do objeto, para que o resultado fosse uma visão normal dele.

Em seguida, vieram dois livros: A arquitetura das torres de extração e das caixas-d’água e Zollern 2. Na década de 1970, parece que os historiadores da indústria monopolizaram o trabalho dos senhores.

HILLA: Foi o que aconteceu!

BERND: Eles queriam escrever e adornar seus tex­tos com nossas fotos.

HILLA: Não conseguiam imaginar que um livro só com fotos funcionaria. Queriam dar a ele uma fun­damentação científica.

Alguma vez chegaram a pensar em se associar a esses historiadores, como um caminho mais fácil?

HILLA: Foi uma experiência ruim. Percebemos pela primeira vez que já não éramos livres. Fomos pagos por hora e entregamos o trabalho. Então, vieram com pedidos, ideias, condições. Era preciso funda­mentar tudo com base na história da técnica.

E essas publicações trouxeram algum proveito ou prejuízo?

BERND: Tiramos delas o melhor proveito possível. Fizemos o projeto gráfico, definimos a sequência das coisas e escrevemos um pequeno texto.

Mas não chegaram a empregar seu conhecimento tipográfico para ganhar dinheiro, como tinham pla­nejado na época da academia.

BERND: Empreguei, sim. Desenhei uns poucos logotipos para empresas e fiz alguns trabalhos na área gráfica. Não a estrela da Mercedes, mas… E Hilla fez trabalhos muito legais.

HILLA: Alguns bem corajosos. Naquela época, havia exposições mundiais por toda parte. Foi a época em que os alemães tornaram a se voltar para fora. Tra­balhei cerca de 15 anos num escritório de arquitetu­ra. Os projetos eram dos pavilhões alemães nessas exposições, em Nova York, em Chicago, em Buenos Aires, em Helsinque. Às vezes, eu ia junto, ajudava na construção e depois documentava tudo. Passei um tempo no Sudão, estive em Trípoli. Para tanto, juntava ideias e material, inclusive fotografias de outros fotógrafos, desenhos. Tudo que tivesse a ver com o tema: exposições mundiais de medicina…

BERND: A exposição de brinquedos foi muito bonita.

HILLA: Em Chicago. Para ela, fui pesquisar no museu de Nuremberg.

Mas isso a senhora fez sozinha. Foi esse o trabalho aplicado pelo qual a senhora foi bem paga?

HILLA: Ganhava-se muito dinheiro. A exposição em Buenos Aires me rendeu um carro novo, além de pagar dívidas e viagens. Era trabalho intenso, de curto prazo, que me financiava pelo resto do ano.

O início da colaboração entre os senhores coincide com os primórdios da arte pop. Lembram-se de ter visto os primeiros trabalhos de Andy Warhol? Men­ciono Warhol por causa do serialismo.

HILLA: Antes dele, vimos Roy Lichtenstein, na gale­ria de Alfred Schmela. Mas o serialismo foi uma decorrência de termos juntado muito material acerca de determinados temas. Só que nossa con­cepção, na hora de apresentar o material, tem mais a ver com o século 19, com o enciclopedismo na botânica ou na zoologia, em que plantas do mes­mo gênero ou animais da mesma espécie são com­parados na mesma página de uma enciclopédia. Estava cada vez mais clara para nós a existência de certas espécies, gêneros e subgêneros dessas estru­turas. Na verdade, é um procedimento antiquado, mas depois foi utilizado na arte conceitual. Por Joseph Kosuth. Gilbert e George, um pouco depois.

Hanne Darboven. [Há um trabalho de Darboven na cozinha dos Becher.]

Em que momento se fixou a sistemática de trabalho?

BERND: Quando decidimos pela tipologia em con­juntos de nove. Antes disso, utilizávamos as mol­duras quadradas.

Porque a moldura quadrada neutraliza o formato.

BERND: Exato, e por isso era possível pendurar duas ou três fileiras, uma em cima da outra. Ao mesmo tempo, podia-se observar que as famílias de objetos ficavam mais parecidas. Veja estes esboços, peque­nas fotos de contato coladas num suporte formato…

HILLA: …1 × 1,5 metro – eram os maiores pedaços de papelão que se podiam comprar.

Papelão!

HILLA: Papelão. Ninguém tinha dinheiro para mol­duras, nem os museus.

Estamos vendo nove torres de resfriamento em for­mato vertical, coladas num papelão.

BERND: E esta foi a primeira tipologia das torres de extração, quando ainda trabalhávamos de for­ma assistemática, de 1961 a 1965. Mas colamos tudo depois da viagem à Inglaterra, em 1966. Eram pequenas fotos de contato sobre uma folha de papel. Hoje esse trabalho está no Getty Museum.

O que era assistemático nesse trabalho?

BERND: Embora sejam torres de extração, há tipos reunidos aí que não apresentam semelhança nenhu­ma. Esta aqui não tem a ver com a série.

Porque está vinculada a uma edificação.

BERND: E porque o formato é horizontal.

Uma torre de extração mais uma edificação resultam em formato horizontal, e o formato horizontal já é parte de outra tipologia.

BERND: Exatamente.

HILLA: Aqui está um tipo já sistematizado. Todas as torres têm algo em comum: o formato da letra A. Há também o aspecto do material. De que são feitas as torres de extração? Há as de madeira, da Pensilvânia; outras são de concreto. Quando se organizam todas elas, percebe-se que estas aqui são francesas, porque dão preferência à pedra.

BERND: Típico da Bélgica e da França.

HILLA: As pequenas, com os chapéus, as superes­truturas de aspecto oriental – essas nós nunca tive­mos na região do Ruhr.

De onde veio o conceito de tipologia? Foi empres­tado ou inventado? E quando o utilizaram pela pri­meira vez?

BERND: No subtítulo do livro Esculturas anônimas – para revogar a brincadeira.

HILLA: A brincadeira com escultura anônima, uma coisa que não dissemos tão a sério. O subtítulo é Uma tipologia das construções técnicas.

Quanto mais parecidas as construções, tanto mais convincentes as tipologias?

BERND: Precisamente. Foi isso que sempre alme­jamos.

Para minha grande surpresa, encontrei no catálogo do Stedelijk Van Abbemuseum uma tipologia em que comparam construções completamente distin­tas. Acho que tem até uma torre de alta tensão.

BERND: Foi uma exceção.

HILLA: É, foi um presente – para Carl Andre, aliás.

Que artistas fizeram parte dos seus anos de forma­ção? De quem se sentiram próximos e com quem, além de Andre, trocaram obras?

BERND: Os mais próximos eram Sol LeWitt e Carl Andre, do ponto de vista da sistemática, do pen­samento.

HILLA: Tínhamos mais intimidade com os artistas que com o pessoal dos museus, para não falar das galerias.

BERND: Andre vinha com frequência a Düsseldorf, e Richard Long também. Muitas vezes Long nos acom­panhava quando íamos fotografar. Tinham grande interesse no que fazíamos, tanto um como o outro.

HILLA: O mundo da fotografia de então rejeitava completamente a nossa fotografia, que era consi­derada “não artística”. O outro lado – o dos não fotógrafos –, ao contrário, a julgava boa.

Com essa estética precisa das imagens, os senhores também não se sentiram um pouco solitários no meio dos conceitualistas?

HILLA: Estávamos sozinhos. Mas não éramos soli­tários. Julgávamos a situação adequada.

BERND: Tínhamos de investir no equipamento. Porque queríamos ter conosco esses objetos, trans­formá-los em fotografia…

HILLA: Com apuro técnico.

BERND: …de modo que os detalhes fossem reco­nhecíveis. Um instantâneo não significava nada para nós. Foi por isso, também, que não nos demos por satisfeitos com negativos em formato 6 × 9 cm e passamos a usar os de 13 × 18 cm.

As pessoas que, na época, defendiam o minimalis­mo e a arte conceitual percebiam esse investimento ou achavam que as fotografias caíam do céu?

HILLA: Não sei. Mas entenderam que tinha de ser feito daquele jeito.

BERND: Houve crítica também.

De que tipo?

BERND: Diziam que não fazia sentido compor ima­gens. Bastava amarrar uma câmera na perna e aper­tar o botão de vez em quando.

HILLA: Mas mesmo essas pessoas acabaram por aceitar o que fazíamos. Doug Huebler, por exemplo, tirava fotografias de tantos em tantos minutos de dentro de um carro; um conceito. Ou Ed Ruscha…

BERND: Ele era mais preciso.

HILLA: Foi ficando com o tempo. A Sunset Boule­vard ainda foi, em grande parte, fotografada de câmera na mão, mas então vêm os postos de gaso­lina, e aí há apuro técnico.

BERND: Nos estacionamentos, era fundamen­tal. Não se pode entortar um conjunto de linhas como aquele, ou a singularidade das faixas de estacionamento pintadas no chão deixa de pro­duzir efeito.

E não pode haver nenhum carro parado ali.

HILLA: É, o que também pressupõe um plano. Para muito artistas plásticos, a fotografia era um recurso a mais, mas eles não tinham por princípio fotografar de câmera na mão. Não fizeram disso uma estética.

Quando os senhores ganharam um nome e um lugar no contexto da arte conceitual, já tinham uma lin­guagem definida? Afinal, poderiam ter encontrado outras formas de expressão, ou ter usado a fotogra­fia como base para vídeos!

BERND: Uma vez, fizemos um filme sobre a mina Hannover.

HILLA: Bom, não precisamos falar sobre coisas que não deram certo.

BERND: Porque era um complexo gigantesco. Fize­mos um filme sobre a mina porque pensamos que poderia ser interessante – mostrar a atmosfera do lugar. Depois, assistimos às filmagens, ainda sem a montagem, e ficamos muito decepcionados.

Como foi que fizeram um filme?

HILLA: Pedimos emprestado a Sigmar Polke uma câmera de 16 milímetros. O consultor, em cer­ta medida, foi Gary Schumm, que tinha feito uma porção de belos filmes de arte, com Gilbert e George, por exemplo. A ideia era mostrar que aquela mina não era um conglomerado muito coeso, como geralmente acontece, mas uma cons­trução esparramada, unida por laços, isto é, por estradas.

BERND: A atmosfera também era muito importan­te. Outro fator importante foi que estávamos com pressa. Pensamos: fotografar a totalidade das ins­talações vai levar anos. Então fizemos o filme, em dois ou três dias.

HILLA: A ideia era rodar toda aquela área extensa e mostrar as conexões entre preparação, torre de extração, usina elétrica e coqueria. Mostrar o movi­mento. Só que ele era tão pequeno que o único movimento que aparece no filme é o nosso. A rigor, quando se observa uma mina, a única coisa que se move é a roda da torre de extração.

Então nada acontece. E tentaram fazer um road movie.

HILLA: Na época, eu pensava nos primeiros filmes de Charlie Chaplin, em que a câmera fica fixa no tripé e tudo o mais se move diante dela.

Yasujiro Ozu, no Japão dos anos 1950, ainda utilizou a mesma técnica.

HILLA: Ou aquele filme de Hitchcock que se passa todo num mesmo espaço: Festim diabólico.

Que curioso citar esses exemplos, porque a senhora não deixou a câmera imóvel.

HILLA: Não, porque isso se podia fazer muito melhor com fotografia. Aquela câmera oscilan­do para cima e para baixo, para a direita e para a esquerda – aquilo não ficou nada bom.

De quando é essa experiência?

BERND: 1973, 1974.

E o filme foi destruído?

BERND: Não.

Quase não ouso perguntar, mas estamos falando de filme em preto e branco?

BERND: Não, era colorido.

É comum remeter a origem da sua estética a Karl Blossfeldt e a Renger-Patzsch. Mas os senhores têm apontado para a fotografia das indústrias, que já existia; com frequência são fotografias anô­nimas.

BERND: Há arquivos gigantescos, como o Arquivo Krupp, o arquivo da siderúrgica Gutehoffnung; e nós olhamos esses arquivos também. Nosso pensa­mento foi: isso já existe, então não precisamos fazer de novo. O que fizemos foi complementar, fazer o que ainda não tinha sido feito.

Se agora recebessem uma dica sobre alguma indús­tria na Coreia, pegariam um avião para fotografar?

HILLA: Eu iria!

BERND: O que pode haver de diferente lá? Hilla esteve até na Sibéria, viu tudo. Não existem varia­ções que possam enriquecer muito o que já temos sobre, por exemplo, o tema dos altos-fornos. Temos o suficiente.

HILLA: Claro, os países de origem dessas indús­trias foram os que fizeram as invenções.

BERND: Agora estamos nos dedicando a viajar no nosso arquivo. Não podemos nos dar ao luxo de sair por aí, ou não vamos conseguir dar conta nem do que já fizemos. Não se trata de fotografar tudo que há no mundo, e sim de provar que uma arqui­tetura composta em essência de maquinário não tem a ver com design nem com arquitetura. São trabalhos de engenharia, donos de uma estética própria. Precisa-se de certa quantidade de formas para comprovar isso, mas chega um momento em que já se juntou tudo o que é necessário. Segui­mos fotografando os silos de armazenamento de cereais, porque surgiram novos tipos – e também não temos o bastante dos antigos –, assim como ainda faltam refinarias e indústrias químicas. Pre­cisamos também de mais fornos de cal.

HILLA: Outra resposta para a mesma questão é que, havendo necessidade de nos limitarmos, melhor é que seja àqueles países de industrialização mais antiga, para que possamos enxergar o período his­tórico. Há certas coisas que, em razão da antigui­dade, encontramos na Inglaterra, na Bélgica, na França, na Alemanha e, até certo ponto, na Itália.

BERND: E nos Estados Unidos.

HILLA: Claro, e lá existem coisas muito interessan­tes, como os silos de cereais. Desses não podemos prescindir. Aí deixa de ser fundamental ter os silos da Coreia.

“Não podemos prescindir” para quê?

HILLA: Para apresentar toda a gama de variações.

BERND: Os americanos foram os primeiros a cons­truir silos de cereais na forma de grandes recipien­tes. São os grain elevators. Construções que pare­cem edifícios. Ainda não havia isso por aqui, os cereais eram entregues em sacas, que eram içadas e empilhadas. Nos Estados Unidos, a quantidade era tamanha que não valia a pena ensacar os grãos. Construíram enormes caixas de madeira, que depois ganharam uma cobertura. Assim surgiram os silos de cereais. Ainda há alguns por lá, grandes e pequenos, nas regiões portuárias.

Os silos de cereais introduzem a questão da arqui­tetura e da propaganda que se faz dela, porque Le Corbusier…

BERND: …toma esses silos como exemplo…

…e retoca as imagens, como é sabido…

BERND: …dispensa toda a ornamentação…

…com o intuito de demonstrar como essa arquitetu­ra é simples.

BERND: O engenheiro como o bom selvagem.

Para fotografar os grain elevators, nos Estados Uni­dos, é necessário pensar em Le Corbusier ou é pos­sível pôr de lado o aspecto propagandístico dos pri­meiros modernos?

BERND: Até tentamos reencontrar aqueles silos, mas eles não existiam mais. Eram exemplos muito bons, mas que o próprio Le Corbusier tirou de catá­logos – o senhor com certeza conhece o livro de Reyner Banham, que mostrou de onde eles vinham.

HILLA: Mas não foi Le Corbusier que trouxe dos Estados Unidos as fotografias dos grain elevators.

Foi Erich Mendelsohn.

BERND: Que também fotografava. Os silos que Mendelsohn fotografou em Buffalo, esses Reyner Banham retomou em A Concrete Atlantis (mit, 1986).

Os arquitetos recorreram aos edifícios industriais para provar que a construção funcional é que era a construção moderna. Mas não quiseram voltar a um tempo em que as construções eram executadas por mestres anônimos…

BERND: …queriam projetá-las eles mesmos.

HILLA: A ideia da transposição é catastrófica, isto é, do silo para o edifício residencial.

BERND: As pessoas são transformadas em merca­doria a granel, içadas para os apartamentos pré­-fabricados e distribuídas!

Ao que eles argumentariam com as funções para as quais os edifícios foram de fato construídos.

BERND: Longe de nós estabelecer essa conexão. O que dizemos é que essa é uma arquitetura de engenheiros, ela existe aqui, ali e acolá. Os silos costumam permanecer como foram concebidos; acréscimos são raros. Ao passo que as construções que abrigam altos-fornos sofrem mudanças cons­tantes; são um conglomerado que se assemelha a uma cidade medieval, em que surgem acréscimos a todo momento. A estrutura básica pode ser da virada do século, sofrendo, então, inúmeras varia­ções. Mas o elevador ainda pode ser visto.

Vocês têm suas edificações preferidas?

HILLA: Os altos-fornos.

BERND: Na Inglaterra, fiquei louco pelas unidades de preparação, muito mais que pelas torres de extra­ção. A unidade de preparação continha a estrutura de aço, que tornava a construção reconhecível, e o preenchimento com tijolos. O desenvolvimen­to natural, o modo como um frontão se segue ao outro: tudo isso ainda existia na Inglaterra. Isso me interessou em especial no tocante às casas, com seu ângulo suave de inclinação dos telhados; não eram como os silos da época de Hitler, copia­dos dos armazéns de grãos da Idade Média – e sim uma forma bonita e harmônica.

HILLA: No começo, você tendia mais para o forma­to da edificação residencial, ao passo que eu me interessava sobretudo pelas estruturas de aço, fora do alcance da arquitetura.

Como fizeram para pesquisar, por exemplo, as caixas­-d’água nos Estados Unidos? Rodaram até encontrar?

BERND: Ali não havia outra coisa a fazer. Elas esta­vam espalhadas. Já na França, elas estão indicadas nos mapas da Michelin, provavelmente como pon­to de referência para os ciclistas. Mas não dá para fotografar muitas delas, porque são desinteressan­tes ou não se tem a distância necessária.

BERND: No caso dos silos de cereais, descobrimos, pela experiência, que sempre havia um nos locais em que uma estrada cruzava a via férrea. Se não estava lá, era porque tinha sido demolido.

HILLA: Nos Estados Unidos, tínhamos mapas fer­roviários.

O senhor assumiu uma cátedra em Düsseldorf em 1976.

BERND: Até 1996.

Aceitou por razões financeiras ou queria mesmo dar aulas?

BERND: Eu me esforcei por dois anos seguidos. O escultor Norbert Kricke teve a ideia de instituir um curso de fotografia. Havia uma pressão resultante da arte conceitual. Muitos estudantes queriam traba­lhar com fotografia. A mesma tendência foi verifica­da nos cursos de pintura. Havia uma lacuna. Klaus Rinke, acho, era a favor da abertura do curso. Gün­ther Uecker também. Naquele tempo, já tínhamos contato com os Sonnabend. Eu disse a Kricke que não dava para conciliar as aulas com nosso traba­lho, porque o trabalho demandava que viajássemos. Durante dois anos, eu ia de um lado para o outro.

E por que a cadeira foi oferecida a Bernd, e não, por exemplo, à senhora?

HILLA/BERND: [muitas risadas]

HILLA: Bernd sempre dissera: ensinar, jamais. Quando Kricke telefonou pela primeira vez, fui eu quem atendi. Ele me explicou do que se tratava, e eu disse: “Sim, aceito”. E ele respondeu: “Não, não, queremos o mestre!”.

BERND: Ele era muito franco.

HILLA: O que eu podia fazer, ficar brava? Estava certo em chamar só um de nós. Com os dois não teria dado certo. Pela própria natureza da ativida­de. Professor é um só. Mas os estudantes estavam sempre aqui. Fizemos muita coisa boa juntos.

Isso não resultou numa divisão do trabalho? A senhora passou a fazer a maior parte do trabalho de laboratório.

HILLA: Claro, na época tínhamos exposições gigan­tescas para alimentar.

A senhora havia sido professora de uma academia de arte em Hamburgo.

BERND: Éramos nós dois, mas eu não tinha vontade de lecionar.

HILLA: Então, fui eu. Isso foi em 1971, 1972, um tempo em que já não se “fazia” arte. Eram os efei­tos de 1968. Arte era tabu. Só uns poucos estudan­tes queriam mostrar seu trabalho, e mesmo assim nunca na presença dos outros. Muitos ficavam sentados no refeitório, sem fazer nada. Alguns só faziam cartazes ou panfletos. Eu tinha adquirido uma coleção de livros de divulgação científica, e depois alguns de ciência pura também. Meu pro­grama consistia em classificar e trabalhar as ilus­trações. Tinha de tudo: física, química, matemáti­ca, geometria e, sobretudo, biologia. Enciclopédias entraram também; tratava-se particularmente de pesquisa iconográfica. Representações não artísti­cas ligadas ao domínio da ciência. A coisa chegou até a Scientific American, a Bild der Wissenschaft – havia ilustrações fantásticas ali.

Desenho ou fotografia?

HILLA: As duas coisas. Eu tinha um pequeno gru­po de estudantes que fez isso por mais de um ano e meio.

E qual era o foco, do ponto de vista da transmissão do conhecimento?

HILLA: Em primeiro lugar, aprender a ver as ilus­trações. Nós as reproduzimos também. Só dava para fazer em preto e branco, porque ainda não dispúnhamos das máquinas de xerox. Não retroce­demos no tempo além da década de 1850, quan­do Ernst Haeckel desempenhou um papel muito importante. Havia os céticos também, os que não aceitavam a popularização da ciência. Convidamos cientistas para conversar conosco sobre a questão da impossibilidade de representação – a quarta dimensão, por exemplo.

Coisas que não há como ilustrar.

HILLA: Sobre as leis da física ou a fórmula quími­ca representada por meio de bolinhas – átomos, moléculas. E, quando queriam nos explicar algu­ma coisa, eles próprios começavam a desenhar. Explicavam como pensavam por meio de imagens. Isso contribuía para o desenvolvimento – e falo de mim mesma – de uma certa lógica visual: como visualizar as coisas. E nisso a biologia é a mais bela e a mais clara das ciências, porque há modos bas­tante específicos de contemplar uma planta ou um animal, morfológica ou historicamente. Na morfo­logia, tem-se o todo, as partes, os cortes, longitudi­nal e transversal. E isso se pode transpor.

As ilustrações eram anônimas ou havia ilustradores excepcionais?

HILLA: Ernst Haeckel é um deles, com seu Formas artísticas da natureza. Em sua viagem pelos mares do Sul, ele fez os desenhos a partir do micros­cópio e, mais tarde, mandou transformá-los em ilustrações.

O confronto com as fontes do século 19 contribuiu para tornar mais claras as tipologias?

HILLA: Com certeza.

BERND: Foi muito mais importante do que se orien­tar na própria fotografia.

HILLA: O quadrado mágico, por exemplo, foi uma descoberta importante. Ele se compõe de nove casas, e a soma de cada fileira – na vertical, na horizontal e na diagonal – dá o mesmo número. É uma harmonia matemática. E isso se pode trans­por para as imagens, inclusive para as gradações do preto e branco e certas tensões resultantes.

BERND: E foi assim que estabelecemos como meta para cada tipologia ter no mínimo nove de cada, para então contrapor esse grupo de nove a outros grupos de nove.

HILLA: Já tínhamos arranjado imagens na forma de comparações…

BERND: …mas foi precisamente nessa época que tivemos a ideia.

Do modo como descrevem essa descoberta, ela foi uma libertação do sentido da leitura.

BERND: Desistimos dos painéis longitudinais e chegamos ao quadrado com 16 motivos, no caso dos motivos horizontais. Quatro motivos na hori­zontal, quatro na vertical, de modo a formar um bloco. Não é o mesmo que os painéis de nove, mas é muito mais harmônico. Quando se ordena lon­gitudinalmente um formato horizontal, automati­camente surgem ruas, e isso nós queríamos evitar.

O projeto acadêmico de Hamburgo foi um truque pedagógico, a fim de mostrar a pessoas que já não con­fiavam em sua força criativa tudo o que já havia sido feito. Mas a senhora assumiu o posto já representan­do a sua fotografia. Só que seu projeto era teórico.

HILLA: Sim, mas havia também muita correção de trabalhos e muita discussão sobre fotografia. Mas a ênfase não era apresentar nosso trabalho foto­gráfico. Houve muita discussão acalorada, em par­ticular sobre marxismo.

A isso, a senhora, como fugitiva da rda, só podia ser alérgica!

HILLA: Era alérgica, sim, mas tinha feito minha lição de casa. Quem leu O capital inteiro? Eu não era vaga como muitos outros.

Quando o senhor decidiu dar aulas, achava que poderia ensinar aos estudantes?

BERND: Não acho que tenha pensado muito no assunto. Aquilo era muito arriscado. Pensei: dois anos; depois mais dois anos; e então mais dois anos. Até que uma equipe coesa acabou se formando, em que uns influenciavam os outros e os temas se complementavam. Naquela época, não tínhamos certeza se queríamos ficar na Ale­manha. Queríamos ir para os Estados Unidos. Se não tivesse tido bons alunos, teria abandonado as aulas.

Por que queriam ir para Nova York?

BERND: O interesse pelo nosso trabalho era muito maior lá. Aqui na Alemanha…

HILLA: …eram sempre perguntas que retornavam ao filosófico. Quem lhes deu o direito… Apresen­tar apenas imagens e ordená-las de determinada maneira não era o bastante na Alemanha. Vinha sempre a pergunta: mas para quê, afinal? Os ameri­canos, e os ingleses também, têm outra abordagem.

O senhor acabou se estabelecendo na academia e deu aulas até se aposentar.

BERND: Era uma obrigação para com os estudan­tes. Ia deixá-los sozinhos? Tinha amigos entre eles – quem iria fazer aquilo? Embora hoje eu veja que aquilo me tomava muito tempo.

Quando o senhor parou, correu o boato de que o curso deixaria de existir. Há na Academia uma hosti­lidade entre os pintores de orientação expressionis­ta e os demais?

BERND: Isso o senhor vai ter de descobrir sozinho, senhor Ziegler! [risadas]

Vamos voltar às preferências iniciais. É correto dizer que o senhor não tinha grande afinidade com a pintura?

BERND: Não, ao contrário. A pintura me interessa­va mais que a fotografia.

HILLA: Era um amor não correspondido.

Até então, a fotografia na Alemanha não estava pre­sente na academia. As escolas superiores formavam pessoas para o ofício prático da fotografia. Otto Stei­nert, professor da Folkwangschule, em Essen, não provinha da fotografia prática, mas sua intenção era formar pessoas para atuar em publicidade ou jorna­lismo. Os alunos queriam aprender coisas práticas demais?

BERND: Esses eu deliberadamente não aceitava. Tive alunos como Thomas Struth. Straßen [ruas], pensei comigo, é muito legal. Era coisa que eu mesmo poderia fazer. Mas, se ele está fazendo, então não preciso fazer. É uma espécie de divisão do trabalho. Ou Candida Höfer, com os espaços interiores. Ela pôde trabalhar durante anos naqui­lo. Quando alguém trabalha durante muito tempo em alguma coisa, obtém algum resultado; acaba sendo influenciado pelo próprio trabalho. O pro­cesso de trabalho, o dia a dia, liberta. Se uma pes­soa chega para você todo dia e diz: “Professor, já terminei a tarefa que o senhor me passou”, isso não faz nenhum sentido.

O senhor não passava tarefas?

BERND: De vez em quando, para aqueles que não se achavam. Mas nunca funcionou. Ou os alunos ficavam obcecados com alguma coisa, e dava certo, ou era melhor largar mão. Também nunca aceitei alunos que trabalhassem com fotografia industrial, porque não queria influenciá-los. Houve uma única exceção, uma moça que fotografava aquelas gran­des escavadoras de carvão aqui da região do Reno.

Estava claro para o senhor que, quando os estudan­tes o procuravam, não estavam particularmente interessados na imagem humana?

BERND: Não, no caso de Candida Höfer esse inte­resse existia também. De início, ela fotografava famílias turcas. Quando parou com os diapositivos, ou seja, quando passou a trabalhar com a fotogra­fia impressa, decidiu-se mais ou menos pelos espa­ços. Mas isso surgiu do trabalho com as famílias.

E a questão da cor e do preto e branco? Tinha uma disputa ideológica aí?

BERND: Estava claro que a cor viria. Naquela épo­ca, tínhamos comprado, ou adquirido por meio de troca, uma pequena série de fotografias de Ste­phen Shore. Elas ficavam penduradas aqui, para todo mundo ver. Isso exerceu certa influência.

HILLA: Os alunos eram bem informados. Eu não limitaria essa influência à obra de Stephen Shore.

BERND: Ainda assim, Stephen Shore foi um dos primeiros a usar a cor em negativo de grande for­mato, de um modo muito pitoresco.

HILLA: Havia toda uma série de fotógrafos ame­ricanos que trabalhavam de um modo preciso e profissional, fosse onde fosse que tivessem apren­dido a profissão. Aquilo era digno de ser imitado.

Hoje, quando comparamos dois de seus alunos, Thomas Ruff e Andreas Gursky, vemos, a despeito das abordagens diversas, que a série fotográfica não desempenha papel importante em nenhum dos dois. Dos grupos de obras de Ruff, pode-se perfeita­mente tomar um trabalho isolado – isso não repre­senta problema para o colecionador. Em Gursky, é ainda mais espantoso. As fotografias se apresentam inteiramente isoladas já pelo seu formato. E, com frequência, duas juntas produzem um resultado mais fraco do que uma sozinha.

BERND: É verdade. Vi isso na exposição em Düs­seldorf: muito próximas umas das outras, elas não funcionam.

O que é espantoso, quando se considera que o senhor promoveu experimentos com o serialismo até dissolver, inclusive, o sentido da leitura. Seus alunos fizeram o contrário.

BERND: Isso depende do objeto da contemplação. Não são tantos os objetos que permitem isso.

Mas o senhor não tentou transmitir uma estética?

BERND: Não. Ela se desenvolve a partir do próprio objeto, se o interesse é sério.

Para o senhor era importante que, uma vez escolhi­do um tema, a pessoa compreendesse e interpretas­se esse tema.

HILLA: A não ser que se tratasse de um tema nati­morto, o que também existe. É o que acontece quando alguém chega e diz que quer trabalhar com flocos de milho. Ou com cabines telefônicas. Ou com automóveis e casinhas de cachorro.

Por que cabines telefônicas não funcionam?

BERND: São todas iguais. A variação está apenas no entorno. Seria pretensioso. Coisas desse tipo foram feitas na arte conceitual.

HILLA: Mas existem temas natimortos, que dá para notar que não vão longe, porque não estão funda­dos na história nem ancorados no presente. Pense na síndrome de Cindy Sherman.

BERND: Isso quase me fez parar, quando as moças todas começaram a brincar de Cindy Sherman.

Mas isso não há de ser tão improdutivo assim – o travestir-se em estúdio, brincar de assumir um papel? Ou será que não fizeram direito?

BERND: Não dá para fazer melhor do que Cindy Sherman fez.

HILLA: Fotografar a si mesmo pode ser resultado também de certa preguiça. Pode-se ficar em casa.

É interessante que, em muitos de seus alunos, a Ale­manha apareça como tema…

BERND: Isso começou com Struth. Ele esco­lheu ruas de Düsseldorf que não tinham atrati­vo nenhum. Depois vieram as fachadas, aquelas modificadas no pós-guerra – privadas de seus ornamentos – ou construídas depois da guerra. Fachadas puras e simples que, reduzidas, resultam numa espécie de colagem; isso produziu um efeito totalmente novo. Desde o princípio, Struth pôs-se no centro, as ruas eram como um envelope.

HILLA: Um triângulo de céu, um triângulo de chão.

BERND: Aí, do lado esquerdo da rua, ele nota algu­ma peculiaridade, por isso se posiciona um pou­co mais para a direita, a fim de privilegiar o lado esquerdo. Então vem a descoberta, quando a rua forma um t com uma transversal: olha-se para a fachada, vista realmente de frente, e duas fileiras de edifícios convergem para ela. Ele percebeu que tinha encontrado uma mina de ouro. A possibili­dade de retrabalhar esteticamente essa Alemanha do pós-guerra. Michael Schmidt já tinha feito coi­sa parecida em Berlim. Só que nele ainda se per­cebe a influência da fotografia americana. Não é?

Com certeza. Mas em Thomas Ruff e em Jörg Sasse vejo também uma forte tendência a ironizar o tema alemão.

BERND: Em Ruff, sobretudo nas fotografias das cozinhas, na casa dos pais e na sala de estar.

Isso deve ter surpreendido vocês.

BERND: Não, por quê?

É verdade que não posso acusá-los de falta de humor, mas ironia nunca houve em suas obras, não é?

HILLA: Não?

BERND: Ela está absolutamente presente nas cai­xas-d’água.

Como filhos da guerra e tendo passado uma parte da infância sob o regime nacional-socialista, cabe perguntar se o sentimento de culpa, a homogeneiza­ção ideológica das indústrias, foi uma preocupação para os senhores.

BERND: Conversamos muitas vezes sobre isso. Mas escolhemos áreas em que nada de específico era produzido: só carvão e aço. Com essas duas coisas, pode-se produzir de tudo, de tanques a brinquedos de lata. A verdadeira motivação para mim, no entan­to, foi o fato de eu ter vivido tudo isso quando criança. Bem ao lado da casa dos meus avós, onde cresci, havia um alto-forno. Eu podia ouvi-lo, vê-lo e sentir o cheiro.

E o senhor consegue apartar essa lembrança daque­la do Terceiro Reich?

BERND: Uma vez conversei sobre isso com Jeff Wall, quando visitamos uma exposição de livros ilustrados sobre a época nazista. Ele disse que não havia nada de especial nas ilustrações, a não ser pelo monte de bandeiras, sempre à vista. Além dis­so, aquela euforia artificial das paradas militares e muitos uniformes. Sempre vi como uma desa­gradável arquitetura nazista aqueles conjuntos habitacionais com seus frontões pontudos, desde criança, embora não tivesse então uma visão glo­bal da coisa. Na década de 1930, casernas foram construídas em Siegen nesse mesmo estilo. Sem­pre pensei no mundo da indústria como completa­mente independente disso tudo. Ele não tem nada a ver com ideologia. É um pensamento mais apa­rentado ao inglês. Um pensamento pragmático.

HILLA: Seria impossível trabalhar com algo que vemos como absolutamente negativo. Quem se ocupa de escorpiões tem também, até certo pon­to, de amar os escorpiões. E a fotografia está aí justamente para mostrar o que existe – e não para separar as coisas e retratar apenas o que é bom ou bonito. Vemos a indústria não como uma força apenas positiva. Ela tem suas crises, seus excessos, seu papel como impulsionadora de guerras… Pro­curamos, em nossa representação, nos compor­tar com a máxima neutralidade, sem incorrer em nenhum tipo de glorificação.

Buscaram um ponto de vista livre de ideologias?

HILLA: Sim, porque não teria dado certo de outra maneira.

Então os senhores são quase embaixadores culturais, viajando de um país a outro e comparando instala­ções industriais. Embora haja elementos nacionais específicos, não há julgamento.

HILLA: Não estamos nas Olimpíadas!

BERND: Mas tivemos nossas preferências. Se o senhor convocasse um historiador da indústria, ou alguém da área da arqueologia industrial, ele veria a coisa de outra maneira. Nós demos preferência às edificações pragmáticas.

Evitaram tudo o que é sobrecarregado, monumental, o romantismo dos palácios e castelos da indústria pesada, as construções em estilo art nouveau?

BERND: Evitamos. Porque dissemos a nós mesmos que a alma do pensamento industrial estava no oposto disso tudo.

É singular que os americanos tenham uma palavra para isso – “vernacular” –, e que nós não a tenhamos.

HILLA: Em alemão, não dá nem mesmo para expli­car do que se trata!

Os senhores veem um vínculo primordial entre a fotografia e o vernacular?

HILLA: Sim, um vínculo fundamental.

Porque, em princípio, a fotografia não julga.

HILLA: Sim. Para mim, a fotografia é, por natureza, livre de toda e qualquer ideologia. Fotografia com ideologia não dá certo. ///

 

Tradução do alemão por Sérgio Telarolli. Uma versão desta entrevista foi publicada na revista Art in America, em junho de 2002.

Tags: , , , ,