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O cotidiano ribeirinho no interior do Pará pelo olhar da fotógrafa Larissa Zaidan

Publicado em: 27 de julho de 2021

Foto da série Pará Paradise, de Larissa Zaidan.

A jornalista Larissa Zaidan começou sua carreira escrevendo matérias para um site de notícias. Mas assim que pôde, trocou o teclado pela câmera fotográfica e saiu em busca de novas histórias para contar com imagens. Isso não faz muito tempo, mas de lá para cá Larissa vem criando um corpo sólido de trabalhos, sejam eles pautas para veículos de imprensa ou projetos pessoais que desenvolve. “Comecei a perceber que me interessava muito retratar os universos das pessoas que tinham minha idade. Depois também percebi que eu me apaixonava por histórias e pessoas, no sentido de ficar encantada, de querer registrá-las de alguma forma”, comenta a fotógrafa. ZUM conversou com Larissa sobre alguns de seus projetos e sua relação com a fotografia.

 

Como começou a sua carreira de fotógrafa?

Larissa Zaidan: Em 2015, quando comecei a trabalhar na VICE como redatora, eu já sentia vontade de fotografar, mas não tinha experiência e nem sabia mexer em uma câmera. Eu já fotografava bastante com o celular e sempre conversava com o editor-chefe da revista, para ver se ele animava de deixar eu fotografar alguma pauta. Até que um dia rolou uma festa/show que ele achou que poderia  ser uma primeira oportunidade para eu fotografar. Essa foi também a primeira vez que usei uma câmera no manual e não no automático. Publicamos essas fotos e, para mim, foi quando passei a enxergar a fotografia como ofício.

 

O seu projeto Pará Paradise registra a vida cotidiana de populações ribeirinhas no interior da Amazônia. Como surgiu seu interesse pelo tema?

LZ: Em 2014 eu fiz o meu TCC de jornalismo com uma amiga numa cidadezinha do Pará chamada Afuá. É uma cidade ao norte do estado, conhecida como a Veneza Marajoara. Ela que teve a ideia, por conta do livro Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios, do Marçal de Aquino. Eu nunca tinha ido para lá, conhecia bem pouco da história e da cultura do estado. Mas foi lá que me interessei pela primeira vez por fotografia. Eu me apaixonei por aquela cidade, vivi um sonho de verdade. Minha ligação com aquele lugar nunca mais se fechou, quase todos os anos eu voltei para alguma cidade da região, ou a trabalho ou para fotografar meu projeto autoral. E aos poucos fui construindo um corpo fotográfico. Mais tarde veio a necessidade de estudar mais, de entender mais profundamente os lugares pelos quais eu passava, de buscar narrativas. E esse é um processo longo. Pará Paradise é uma série que com certeza ainda vou levar muito anos para encerrar.

Você está bastante familiarizada com trabalhos jornalísticos, pautados por veículos de mídia. Quando você desenvolve um projeto pessoal, que elementos do fotojornalismo mais tradicional você usa e quais você intencionalmente evita?

LZ: O fotojornalimo me ensinou a conseguir tirar muito de situações em que tenho pouco. Em todos os sentidos. Muitas vezes não dava para levar luz, objetos, nada que de alguma forma pudesse enriquecer imageticamente a minha fotografia. Então eu aprendi a chegar nos lugares e ter uma percepção do universo ao meu redor e do que eu poderia usar a meu favor para retratar aquela situação ou história. A pesquisa que o fotojornalismo requer também me ensinou bastante no sentido de afunilar as pautas, buscar personagens, encontrar boas histórias. Ao mesmo tempo, eu tento me distanciar bastante do comprometimento com o factual que existe no fotojornalismo. Há pouco espaço para criação no universo do fotojornalismo, você é mais um operário da fotografia. O que é maravilhoso também, mas em certo ponto não me satisfazia mais, eu tinha vontade de criar narrativas, de poder mexer mais com a imaginação.

 

Você tem um forte trabalho de retratos, principalmente de pessoas jovens. O que lhe atrai nas pessoas que deseja retratar?

LZ: Eu não sei muito bem. Cada hora eu encontro um sentido para isso. Eu comecei fotografando as pessoas que estavam perto de mim, não só meus amigos, mas personagens que eu ia encontrando no meu caminho. Por conta da VICE e das pautas que eu fazia, muitas vezes ia a lugares que talvez não tivesse acesso sozinha. E comecei a perceber que me interessava muito retratar os universos das pessoas que tinham minha idade. Então acho que começou assim. Depois também percebi que eu me apaixonava por histórias e pessoas, no sentido de ficar encantada, de querer registrá-las de alguma forma. Eu amo uma palavra que me falaram uma vez: mojo. É como um poder pessoal que certas pessoas têm, que nos sugam para seu mundo. Eu sempre busquei muito isso, sem nem saber o que era isso. Buscava muito também algo melancólico, uma procura mais minha de tentar responder algumas perguntas. Uma sequência de fatos que moldaram essa minha atração pelas narrativas que fotografo.

Quais fotógrafos ou artistas considera uma referência?

LZ: Eu tenho tendência a ficar meio obcecada pelas coisas que me interesso (o que me ajuda e me atrapalha várias vezes). Então normalmente minhas referências mudam e costumam ser únicas durante um período. Nos últimos tempos, por exemplo, eu tenho estudado o trabalho do Masahisa Fukase, então vou lá e compro os livros, leio entrevistas, fico meio vidrada no universo dele. O Tarkovsky também é um cara que fica muito na minha cabeça: eu leio e releio o livro dele, estudo os filmes, vejo documentários. Meu trabalho acaba sendo muito influenciado por esses períodos em que mergulho no trabalho de quem me toca.

 

Em que projetos está trabalhando agora?

LZ: Eu tenho sempre em mente algum projeto novo que quero começar. Eu acabei de voltar de Rondônia, onde fui fazer um trabalho sobre questões ligadas ao desmatamento e proprietários rurais. Então isso está bem fresco comigo e estou começando a editar esse trabalho. Mas antes da pandemia  comecei a organizar um projeto que devo retomar logo, uma pesquisa que venho fazendo sobre o sistema carcerário feminino. ///

 

Larissa Zaidan é fotógrafa e diretora de fotografia que atua nas áreas de fotografia documental e comercial.

 

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